Está em curso, na Região Metropolitana de São Paulo, a maior pesquisa de mobilidade urbana já realizada na América Latina. Trata-se da Pesquisa Origem e Destino (OD), que é realizada a cada 10 anos pelo Metrô de São Paulo. Além de maior, a pesquisa pretende ser também a mais completa, tendo como desafio mapear os deslocamentos diários de mais de 150 mil pessoas.
Cerca de 32 mil domicílios da região estão sendo visitados pelos pesquisadores com o intuito de traçar, com o emprego de critérios estatísticos e recursos tecnológicos, um perfil socioeconômico da população, para onde as pessoas estão se deslocando, quais os motivos desses deslocamentos e como eles são feitos. Todas as formas de mobilidade estão sendo computadas, sejam elas motorizadas (transporte coletivo e individual) ou não motorizadas (viagens a pé e de bicicleta).
Além do levantamento domiciliar, a pesquisa OD está entrevistando, ainda, passageiros que embarcam ou desembarcam nos aeroportos de Guarulhos e Congonhas, nos terminai
Está em curso, na Região Metropolitana de São Paulo, a maior pesquisa de mobilidade urbana já realizada na América Latina. Trata-se da Pesquisa Origem e Destino (OD), que é realizada a cada 10 anos pelo Metrô de São Paulo. Além de maior, a pesquisa pretende ser também a mais completa, tendo como desafio mapear os deslocamentos diários de mais de 150 mil pessoas.
Cerca de 32 mil domicílios da região estão sendo visitados pelos pesquisadores com o intuito de traçar, com o emprego de critérios estatísticos e recursos tecnológicos, um perfil socioeconômico da população, para onde as pessoas estão se deslocando, quais os motivos desses deslocamentos e como eles são feitos. Todas as formas de mobilidade estão sendo computadas, sejam elas motorizadas (transporte coletivo e individual) ou não motorizadas (viagens a pé e de bicicleta).
Além do levantamento domiciliar, a pesquisa OD está entrevistando, ainda, passageiros que embarcam ou desembarcam nos aeroportos de Guarulhos e Congonhas, nos terminais rodoviários do Tietê, Barra Funda e Jabaquara e os passageiros de ônibus fretados que param nas estações do metrô. Até mesmo os que usam a Região Metropolitana de São Paulo apenas como passagem, com outros destinos, entrarão na contagem. Foram instalados postos de observação em 22 rodovias que cortam o perímetro metropolitano, onde pesquisadoras contam todos os veículos que passam e, por amostragem, entrevistam seus ocupantes.
Os resultados da pesquisa servirão de base para a elaboração de políticas públicas de mobilidade para a região, para a execução de modelos de simulação de demanda, para a definição de estratégias e prioridades de investimentos em futuros corredores de transporte, tanto pelo poder público quanto para a iniciativa privada, e, até mesmo, para subsidiar estudos acadêmicos e pesquisas de mercado nas áreas de segurança, saúde, educação e logística, entre outras.
Para detalhar a metodologia da pesquisa, sua aplicações, desafios e soluções na sua execução, Grandes Construções entrevistou Luiz Antônio Cortez Ferreira, gerente de Planejamento, Integração e Viabilidade de Transporte Metropolitano do Metrô de São Paulo.
Revista Grandes Construções – Quais os objetivos da Pesquisa Origem-Destino que o Metrô de São Paulo está realizando?
Luiz Antônio Cortez Ferreira - A pesquisa Origem-Destino (OD) é a mais completa fonte de informações para as questões de mobilidade numa determinada região. Ela dá as respostas mais completas para se traçar um mapa de todos os deslocamentos que a população realiza rotineiramente, que são necessários para o planejamento do transporte. Ela é aplicada sempre com base nos dias úteis, em períodos típicos. Ou seja, ela não pode ser aplicada em períodos de férias escolares, nem em finais de semana, não pode ter nenhuma excepcionalidade, como uma paralisação ou uma chuva muito forte, por que isso altera o cenário. Uma vez bem realizada, ela permite obter um panorama muito bom dos deslocamentos da população. E o interessante é que através dela se consegue ver os deslocamentos de todas as camadas da população, nos diversos modos de transporte, inclusive nas viagens a pé. A pesquisa OD é, portanto, uma ferramenta muito útil para traçar o diagnóstico e para a elaboração de políticas públicas do planejamento da mobilidade.
GC – Os indicadores que advêm desse tipo de pesquisa costumam de fato orientar as decisões do poder público?
Cortez – Sim. Quando você tem uma região metropolitana de grande porte, como a de São Paulo, com uma dinâmica muito complexa, a pesquisa OD passa a ser essencial. Em uma aglomeração urbana menor você até consegue dominar a realidade sem fazer uma pesquisa OD. Mas quando você vai para os grandes centros ela fundamental. Além disso, a pesquisa é essencial para a elaboração de grandes empreendimentos de mobilidade e infraestrutura porque ela alimenta os modelos matemáticos de simulação de demanda. Sem uma boa pesquisa OD não se consegue rodar os modelos de simulação de demanda, o que resulta em uma grande dificuldade em avaliar a viabilidade econômica, financeira e social dos empreendimentos. Ela é, portanto, essencial para o sucesso de um grande empreendimento, que precisa ser bem embasado.
A falta de uma pesquisa OD, muitas vezes, está na raiz do insucesso de muitos desses empreendimentos, que não tiveram adequadamente dimensionadas as demandas, finalidades e a própria viabilidade financeira.
GC – Então, a pesquisa OD pode servir de subsídios para os investimentos a serem feitos também pela iniciativa privada, no âmbito dos transportes e da mobilidade urbana?
Cortez – Claro! Sem ela você tem aumentada a margem de risco. Principalmente no contexto atual, quando é desejável um envolvimento maior do capital privado. Quanto menor a margem de risco, melhor para o investidor privado e para o poder concedente.
GC – Dá para entender como a pesquisa pode mapear e identificar as demandas existentes. Mas o metrô tem, também, a função de indutor de desenvolvimento e de ocupação do solo urbano. Como a pesquisa pode definir parâmetro para identificar e mapear linhas novas ou projetos grandes de corredores de transporte que não existem, hoje, mas que são necessários para a cidade crescer de forma mais organizada e racional?
Cortez – O planejamento da rede transporte tem que considerar as demandas, as grandes necessidades deslocamentos que já estão estabelecidas pela população. Mas ele tem que estar muito atento, também, ao planejamento urbano como um todo, às diretrizes estratégicas de desenvolvimento, que são estabelecidas pelos municípios – e essa é uma atribuição constitucional dos municípios. O plano de transportes é um diálogo entre a necessidade de constatada na pesquisa OD e as intenções de desenvolvimento futuro daquela cidade, daquela região metropolitana. É necessário equilibrar essas duas coisas. Uma vez que se estabelece uma rede futura, mesmo sem horizonte de tempo definido, para mais de 20 anos, é necessário priorizar os investimentos. Você tem um conjunto grande de investimentos desejáveis, mas como é que se estabelecem as prioridades? Com base em que? Você vai poder usar aqueles que vão trazer maior retorno para população, ao mesmo tempo verificando o impacto na rede existente. Você pode considerar que seria ótimo levar uma linha de metrô para determinado local, mas que você pode, com isso, provocar um grande desequilíbrio para o sistema.
Portanto, uma vez desenhada essa rede futura, você deve ir debulhando isso, usando os resultados da pesquisa, até chegar às linhas prioritárias, definindo, assim, a sequência de Investimentos.
GC – Em uma região metropolitana do porte de São Paulo, o ideal é que se faça a pesquisa OD em que intervalo de tempo?
Cortez – Não existe uma regra, mas existe uma prática adotada internacionalmente, que é fazer a pesquisa a cada 10 anos. Aqui em São Paulo, o metrô tem feito essa pesquisa decenal desde 1967. Essa é a sexta que fazemos. Mas a região metropolitana ganhou uma dinâmica tão intensa que se estabeleceu a necessidade de uma pesquisa mais simples, com uma amostra menor, a cada cinco anos. Isso vem sendo feito desde 2002, no intervalo entre uma pesquisa decenal e outra. A diferença fundamental entre elas é agregação das zonas de origem e destino e o tamanho da amostra, por consequência. Com essa pesquisa de mobilidade, a cada cinco anos, se consegue medir uma tendência, mas não dá para alimentar os modelos de simulação.
GC – A pesquisa OD é domiciliar e não nas estações de metrô e nos terminal de integração com outros modos de transporte, não é?
Cortez – Não, ela não é só domiciliar. Na realidade são duas pesquisas em uma. A pesquisa domiciliar vai identificar os deslocamentos internos da região metropolitana de São Paulo. Com ela se entrevista todos os moradores de residências, dentro de uma amostra estratificada, forma que se consegue, depois, usando critérios estatísticos, expandir essa amostra de cada Zona OD, para o total da sua população. A partir daí entram os modelos de geração, atração de viagens etc.
Sobre esses dados coletados é aplicada toda uma metodologia estatística da pesquisa, tanto na definição do plano amostral quanto depois, na expansão dos resultados. Tanto que a gente insiste na questão da segurança em responder a pesquisa, porque os dados individuais desaparecem no momento da expansão. Não há o menor risco de se identificar quem foi pesquisado ou não. Cada pesquisado vai representar o total da população a partir da expansão da amostra.
GC – Que percentual da população de cada região responde à pesquisa?
Cortez – Não há um número específico. A gente aumenta um pouco a amostra em determinadas regiões, quando quer ter um índice de confiabilidade maior. Isso acontece, por exemplo, nas regiões onde a gente sabe que há uma linha planejada. Nesses casos, o custo é maior, bem como a dificuldade de realização.
Especificamente nos modelos de demanda existe uma subdivisão das zonas OD, que chamamos de subzonas. Para as 517 zonas vamos ter mais de duas mil subzonas. Isso permite que tenhamos mais acurácia na determinação da demanda lindeira. Se, eventualmente, duas estações caírem dentro da mesma zona, com essa metodologia a gente consegue estabelecer qual a demanda de cada uma delas. Em algumas situações, quando a zona é um pouco maior, a gente também aumenta a amostra, para ter mais volume e consistência.
GC – E qual é a outra forma da pesquisa?
Cortez – Ela serve para mapear as outras viagens que não podem ser medidas com a pesquisa domiciliar, que são aquelas com origem fora da região metropolitana. Há muitos veículos que apenas cruzam a região usando o sistema viário de São Paulo, cujos ocupantes não têm nenhum interesse na região metropolitana. Eles estão apenas de passagem. Para esses casos a gente faz aquilo a que chamamos de pesquisa da linha de contorno. A gente traça um perímetro que coincide com as linhas de limite dessa região, e em cada uma das rodovias, coloca um posto de pesquisa que faz a contagem classificada dos veículos e, por amostragem, entrevista os seus ocupantes, tanto na entrada quanto na saída da região metropolitana. Porque é deste comparativo entre entradas e saídas que se consegue identificar quem está só cruzando a região.
GC – Mas para que se precisa saber quem está só de passagem?
Cortez – Uma das etapas do modelo de simulação é quantificar a velocidade do sistema viário, através do fluxo de veículos. Para isso é preciso saber qual é o fluxo de veículos, simular a velocidade do sistema viário, saber qual é a velocidade média desse sistema viário. Com isso você consegue identificar qual é a velocidade média do sistema sobre pneus, do sistema de ônibus, ter uma precisão maior da divisão de viagens por modo de transporte e identificar as escolhas da população por modo de transporte.
É evidente que quanto mais cai a velocidade média no sistema viário, mais aumenta a demanda por sistemas tipo metrô, que têm uma velocidade média muito maior.
Além das rodovias, também fazemos pesquisas de linha de contorno nos aeroportos, nos terminais rodoviários e em algumas estações de metrô onde há uma concentração muito grande de ônibus fretados que vêm de vários pontos da região metropolitana.
GC – Qual é o estado da pesquisa de hoje? Em que ponto ela se encontra?
Cortez – Nós estamos com oito meses de pesquisa e já concluímos, em dezembro, a etapa de campo da pesquisa na linha de contorno. Agora estamos na fase de montagem do banco de dados. Já a pesquisa domiciliar foi retomada, depois do período excepcional do fim de ano, e nós temos um prazo contratual até o final de junho para finalização da amostra. Essa pesquisa foi interrompida em 3 de dezembro e retomada em 20 de fevereiro, e vamos ter até o final do primeiro semestre, antes das férias escolares, para conclui-la. E uma vez concluída essa etapa, nós montamos o banco de dados, fazemos a expansão e processamos os resultados. Se tudo der certo, nós teremos condições de ter os primeiros resultados no final do ano, já dando para ver como é que foi a evolução da divisão modal, o total de viagens, os primeiros indicativos começarão a surgir.
GC – Qual é o custo estimado dessa pesquisa e como foi montada a sua engenharia financeira?
Cortez – Nas edições anteriores os recursos vieram do Tesouro do Estado. Nesta edição nós pudemos contar com financiamento do Banco Mundial. Felizmente, porque estamos em um período de parcos recursos do governo. Além do financiamento, também contamos com apoio técnico do Banco, o que para nós é muito interessante. A nossa estimativa original era de um custo de US$ 10 milhões, mas nós conseguimos uma redução muito importante, para US$ 6 milhões, porque conseguimos otimizar os contratos, com descontos expressivos, durante os processos licitatórios.
Para o trabalho de campo nós contratamos empresas especializadas, institutos de pesquisa. Cada uma delas é responsável por um segmento do território da região metropolitana.
Esse financiamento do Banco Mundial permitiu que a gente investisse também no que chamamos de componente de inovação tecnológica. Nós temos duas vertentes de inovação. Uma é na aplicação da pesquisa no campo, tanto na linha de contorno quanto na pesquisa domiciliar, em que nós desenvolvemos um sistema baseado em web e com tablets na aplicação da pesquisa. O pesquisador em campo está ligado em tempo real com servidores. Todas as empresas dos institutos de pesquisa contratados têm a informação em tempo real. Com o GPS é possível saber, do escritório, a cada momento, qual é a localização do pesquisador. Isso permite um controle mais efetivo de todo o processo.
Além disso, um aplicativo instalado no tablet tem uma série de consistências que evitam o retrabalho. Vamos imaginar que, por engano, o pesquisador anote que uma criança foi para a escola de automóvel e mais ninguém na família declarou essa viagem. Temos aí uma inconsistência, já que essa criança não dirigiria sozinha esse automóvel. Antes quando aparecia isso no questionário de prancheta, o pesquisador tinha que voltar à residência e conferir esses dados. Com esse componente de inovação, o aplicativo já aponta a inconsistência que é corrigida na hora.
GC – Em alguns países na Europa, nas grandes cidades ou regiões metropolitanas, são usados os sinais de smart phones para rastrear e mapear os grandes deslocamentos da população, através do GPS, de forma muito rápida. Isso não poderia estar sendo usado aqui no Brasil?
Cortez – Além do que falamos de componentes de inovação, nós temos outra contratação, para um piloto, com o objetivo de averiguar que outras tecnologias disponíveis poderiam ser utilizadas.
Esse piloto teria como foco automatizar a contagem classificada de veículos nas rodovias na linha de contorno, que hoje é manual.
Começamos essa investigação há dois anos, pelo Grupo Telefônica (N.R.: prestador de serviços de telefonia fixa no estado de São Paulo e telefonia móvel em todo o território nacional), porque tivemos notícia de que ele oferecia esse tipo de serviço. Conversamos com técnicos, tivemos várias reuniões, mas concluímos que não há como utilizar essa tecnologia para obter os dados que precisamos para alimentar o modelo de simulação. Com a tecnologia oferecida você consegue ver os grandes movimentos, mesmo assim com dificuldades, com barreiras técnicas, já que nem todas as áreas têm cobertura. Mas o principal problema é que você não identifica exatamente qual é a origem nem qual é o destino dessas pessoas, a faixa etária, empregos, renda familiar etc. Você não consegue montar a matriz OD com as informações mínimas necessárias para o modelo de simulação rodar.
GC – Essa pesquisa vai, ainda, pautar estudos acadêmicos e de mercado nas áreas de saúde, segurança pública, educação, logística etc. Como isso será feito?
Cortez – Sim, e servirá para a formulação tanto de políticas públicas quanto para estudo de mercado, para iniciativa privada. Os resultados da pesquisa OD são públicos e estão disponíveis no site do Metrô-SP desde a pesquisa de 1997 até 2012. Lá você encontra a matriz OD integral, inclusive as pesquisas de mobilidade. Quem tiver o conhecimento de processamento de banco de dados vai poder extrair as informações que precisar.
GC – Em quando tempo os senhores acham que vão completar as análises de todas as informações colhidas?
Cortez – Nós vamos fazer, primeiramente, uma tabulação geral, uma síntese dos resultados mais importantes, que permitem que a imprensa e a sociedade em geral tenham uma ideia de como está se comportando o transporte na região. A partir daí nós vamos fazer os cruzamentos e as tabulações na medida das nossas necessidades.
A nossa ideia é fechar a matriz OD até o final do ano. Ao longo de 2019 nós vamos ter outra contratação, já em andamento, para a atualização da rede de simulação. A cada 10 anos também é feito isso, que é um mapa georreferenciado de toda a rede de transporte da região, contendo todo o sistema viário, com as respectivas capacidades, toda a rede de transporte público, metropolitano e municipal, linhas de metrô, ferrovias etc. Em cima dessa base nós lançamos todas as linhas e projetos que conseguimos identificar – tanto da Secretaria de Transportes Metropolitanos quando da SPTrans, das operadoras municipais etc – nos diversos cenários de tempo.
Com base nisso nós calibramos o novo modelo de simulação, ao mesmo tempo que fazemos um estudo prospectivo do cenário socioeconômico nos diversos anos-horizonte.
O planejamento da rede é sempre para 20 anos.
GC – Quantos deslocamentos ocorrem hoje, em termos globais, na Região Metropolitana de São Paulo e como se configura a matriz de transporte nessa região?
Cortez – São mais de 43 milhões de viagens por dia, sendo 1/3 de viagens não motorizadas (bicicleta e a pé), 1/3 de viagens por transporte individual e 1/3 por transporte coletivo nos diversos modos.
Acesse mais informações:
Av. Francisco Matarazzo, 404 Cj. 701/703 Água Branca - CEP 05001-000 São Paulo/SP
Telefone (11) 3662-4159
© Sobratema. A reprodução do conteúdo total ou parcial é autorizada, desde que citada a fonte. Política de privacidade