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Revista GC - Ed.64 - Outubro 2015
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Entrevista

Como a mobilidade urbana pode salvar vidas

Cidades precisam integrar sistemas de transporte sem deixar de lado a visão sistêmica e a ênfase na segurança de trânsito e redução de acidentes

Entrevista com Dario Rais Lopes - Secretário Nacional de Transporte e da Mobilidade Urbana do Ministério das Cidades (SEMOB)

Dario Rais Lopes, um dos maiores especialistas em mobilidade do país, tem uma longa vivência na área de transporte.  Secretário Nacional de Transporte e da Mobilidade Urbana do Ministério das Cidades (SEMOB), vem conduzindo uma série de projetos nessa área, associando a questão da segurança do trânsito às soluções de mobilidade urbana. Engenheiro de Aeronáutica formado pelo Instituto Tecnológico da Aeronáutica (1979), doutor em Engenharia de Transportes (Poli/USP, 1989), já foi superintendente do Daesp (Departamento Aeroviário do Estado de São Paulo), presidente da Dersa e Secretário de Estado dos Negócios dos Transportes de São Paulo.

Daí a importância de ouvir sua voz não somente sobre os investimentos em mobilidade, mas também sobre como a questão está diretamente associada à segurança no trânsito.  Durante audiência pública sobre Mobilidade Urbana e Acessibilidade, junto à Comissão de Direitos Humanos e Legislação Par


Entrevista com Dario Rais Lopes - Secretário Nacional de Transporte e da Mobilidade Urbana do Ministério das Cidades (SEMOB)

Dario Rais Lopes, um dos maiores especialistas em mobilidade do país, tem uma longa vivência na área de transporte.  Secretário Nacional de Transporte e da Mobilidade Urbana do Ministério das Cidades (SEMOB), vem conduzindo uma série de projetos nessa área, associando a questão da segurança do trânsito às soluções de mobilidade urbana. Engenheiro de Aeronáutica formado pelo Instituto Tecnológico da Aeronáutica (1979), doutor em Engenharia de Transportes (Poli/USP, 1989), já foi superintendente do Daesp (Departamento Aeroviário do Estado de São Paulo), presidente da Dersa e Secretário de Estado dos Negócios dos Transportes de São Paulo.

Daí a importância de ouvir sua voz não somente sobre os investimentos em mobilidade, mas também sobre como a questão está diretamente associada à segurança no trânsito.  Durante audiência pública sobre Mobilidade Urbana e Acessibilidade, junto à Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal, Dario fez um brilhante diagnóstico sobre a realidade brasileira nessa área, reproduzido abaixo. Destacou que os bons projetos de mobilidade devem ser estruturantes do ponto de vista da política de uso e ocupação do solo. E citou o exemplo de Curitiba, cidade que tem um longo histórico de investimento em mobilidade, e hoje detém índices de mortes no trânsito similares aos do Japão, e bem distantes do índice nacional. Segundo Dario, que participou em setembro do Congresso Internacional Cidades & Transportes, promovido pela WRI Brasil Cidades Sustentáveis, da carteira de mobilidade urbana de R$ 153 bilhões, hoje o estado de São Paulo recebe 40% dos recursos, justificável pela complexidade dos problemas e déficit dos sistemas de transporte, sobretudo na Região Metropolitana (RMSP).

Como conceituar a mobilidade urbana?

Dario Rais Lopes  - Mobilidade urbana é o deslocamento de pessoas e bens no espaço urbano atendendo a três atributos. O atributo de espaço, o atributo de tempo, atributo de estado.  O atributo de espaço diz respeito à possibilidade das pessoas se deslocarem de onde estão para onde desejarem. O atributo de tempo diz respeito à possibilidade das pessoas se deslocarem e chegarem ao destino dentro do tempo desejado, e o de estado, a chegar com conforto e segurança.  Prevê a possibilidade de deslocamento por qualquer modo de transporte público.

O conceito de segurança é intrínseco à mobilidade. Por tratar de atributos como tempo, espaço e estado, a mobilidade trabalha no âmbito urbano com a organização da cidade. Ao aproximar as atividades meio e fim, habitação e trabalho, habitação e serviços, estão sendo oferecidas melhores condições de mobilidade.

Então mobilidade é mais do que pensar em transporte coletivo. É pensar simultaneamente no uso do solo, que vai definir os padrões de deslocamento e no tipo de transporte, que é a forma como vai ser feito esse deslocamento. Soluções de mobilidade, portanto, acabam sendo soluções estruturantes, no sentido de mudar ou aprimorar o desenho de uma cidade.

Como enxergar a questão da segurança no trânsito?

Dario Rais Lopes - O trânsito depende de três grandes pilares centrais: a Engenharia, a educação e a fiscalização. O primeiro pilar é a Engenharia, pois é através dela que as condições físicas serão estabelecidas. É através da boa Engenharia, do uso de técnicas do desenho adequado das vias de circulação, que se ajuda a disciplinar o mau condutor. Por outro lado, uma Engenharia má, por exemplo uma sobre-elevação invertida ou um ciclo semafórico mal calculado imputa ao bom condutor riscos desnecessários. Isso é harmonizado através da Engenharia. As boas soluções de Engenharia de mobilidade são soluções que não só permitem um bom deslocamento, mas criam um ambiente no qual se tem menor probabilidade de acidentes.

Como as boas soluções de mobilidade ajudam na prática?

Dario Rais Lopes - A primeira grande solução de mobilidade urbana do mundo é uma solução brasileira. São os trinários da cidade de Curitiba. Trinario é um corredor que em Curitiba chama-se canaleta. Ao lado da canaleta há uma avenida. A umas duas quadras dessa canaleta, há uma avenida que funciona em binário, com uma pista que vai ao centro e outra que vem do centro. Entre essas duas avenidas de sentido único fica o que se chama de setor estrutural do trinário.

É no setor estrutural do trinário que você permite maior adensamento. A partir das quadras externas ao setor estrutural do trinário vão se reduzindo as cotas, ou o adensamento. Com isso, há mais pessoas morando próximas ao sistema de transporte, que tem prioridade.  Isso é uma solução integrada, uma solução de mobilidade. O resultado concreto dessa história toda, que começou a ser planejada em Curitiba nos anos 1960.

Por que tantas mortes no trânsito?

Dario Rais Lopes - Para falar disso vou resgatar alguns indicadores.  Lamentavelmente, a nossa situação em termos de indicadores de segurança de trânsito não é das mais confortáveis. Mas segundo o índice mais usado pela Organização Mundial de Saude (OMS), que é o número de mortes no trânsito por 100 mil habitantes, o Brasil tem um dos números mais incômodos, de 22 mortos por ano por cada 100 mil habitantes. Isso é ruim, desconfortante, mas não é o caos. Na Nigéria, esse número é de 35 por mil habitantes. Mas queremos ser comparados com o Reino Unido, onde esse indicador  é de 3,7 por 100 mil habitantes.  Somos um dos Brics (BRICS: Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), Os Brics têm indicadores em torno de 19 e 22 mortes por 100 mil habitantes.

Isto é uma coisa interessante como estudo sociológico, econômico: como esses países de inserção tardia na globalização acabam tendo o mesmo comportamento. Mas vamos voltar a Curitiba. Lá, o indicador é de 5,2 mortes por 100 mil habitantes, quando a média brasileira é de 22. A média de Curitiba é a mesma do Japão de dois anos atrás. Ou seja, boas soluções integradas, soluções que respeitam e adotam integralmente questão da mobilidade criam um ambiente propício a ter mais segurança no trânsito. Eu diria que as boas soluções de Engenharia da mobilidade são uma condição necessária, mas não são suficientes.

Como o uso e ocupação do solo interferem na segurança de trânsito?

Dario Rais Lopes – Essa visão foi muito desenvolvida em função do arquiteto Jaime Lerner. Foi ele que coordenou os primeiros estudos desse sistema em Curitiba. Tanto que se chamou canaleta, e não corredor, porque esse termo não existia no começo dos anos 1960, e foi colocado por um conjunto de professores da Universidade de Arquitetura e de Engenharia Civil. E eu quero fazer justiça às Universidades de Engenharia. Canaleta dava a noção de fluidez.

As soluções de mobilidade são muito importantes. É importante a posição do Distrito Federal de agregar isso aos seus planos de mobilidade atuais, a começar com a questão do uso do solo, organizando o uso do solo, dando prioridade aos modos de transporte em que se tenha redução das distâncias. Para as grandes distâncias, prioridade aos modos coletivos. Isso não garante que se tenha um indicador de segurança que seja o da Grã-Bretanha, mas é uma condição importante e necessária. Eu penso que o caminho nesse sentido é fundamental para obter bons resultados.

Há outras iniciativas pelo Brasil?

Dario Rais Lopes - Vou dar alguns exemplos, que estão acontecendo no Brasil. Nós estamos apoiando, entre os vários projetos, um no interior no Rio de Janeiro, onde está se reestruturando a rede de transporte coletivo por meio de corredores onde há a alimentação tradicional. Mas o mais interessante nesse sistema é a alimentação também por uma via para bicicleta. Então a pessoa sai de sua casa de bicicleta e chega estação de transporte coletivo, e lá há um bicicletário.

Existem iniciativas muito interessantes e ricas como um todo.  Volto de novo a Curitiba. Eu tive a oportunidade de fazer carshering por lá. Como é um projeto inicial, por enquanto está sendo implantado entre os órgãos da administração pública. A pessoa sai do palácio do governo e vai para outro órgão usando o carro elétrico. É um carro que não tem ruído nenhum, é uma experiência riquíssima. Penso que temos pelo país iniciativas que devem ser resgatadas no sentido de disseminar as boas práticas principalmente, aquelas que dão a ideia de que as soluções de mobilidade devem ser implantadas com essa visão sistêmica de segurança no trânsito e uso do solo. Mas elas não são as únicas soluções, com certeza há que se avançar mais para que se tenha uma efetiva segurança no trânsito.

Da carteira de R$ 153 bilhões em projetos do Ministério das Cidades, São Paulo recebeu 40%

Segundo Dario Rais Lopes, Secretário Nacional de Transporte e da Mobilidade Urbana do Ministério das Cidades (SEMOB), da carteira de mobilidade urbana de R$ 153 bilhões, o Estado de São Paulo recebe praticamente 40% dos investimentos. O Ministério das Cidades atua desde a fase de planejamento e assessoria técnica aos municípios na elaboração dos planos de mobilidade até a destinação de recursos federais, sejam do Orçamento Geral da União, ou do Fundo de Garantia ou do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).

Os projetos de mobilidade hoje priorizam a integração modal e o transporte seguro para pedestres e bicicletas. Destacam-se os empreendimentos de sistemas de alta capacidade, como Veículo Leve sobre Trilho (VLT), ou Bus Rapid Transit (BRT), que estão sendo implantados em grandes cidades como Rio de Janeiro (RJ) e Belo Horizonte (BH), entre outras. Na opinião dele, a Sociedade é um dos principais agentes dessa transformação.  “Eu vejo como um aspecto muito positivo a participação da Sociedade nesse sentido, assim como a atuação dos segmentos organizados da indústria e até mesmo dos ministérios. Nos municípios com menos de 250 mil habitantes, essa questão da mobilidade também vem ganhando mais prioridade. Isso mostra que o futuro tende a ser melhor que a situação atual”.

 

 

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