Infraestrutura
Exame
07/12/2012 10h46 | Atualizada em 07/12/2012 13h11
Quando o Programa de Aceleração do Crescimento (pac) foi lançado em 2007, sua proposta era investir na infraestrutura para apressar o desenvolvimento. Obras esperadas há décadas, como a melhoria do acesso ao porto de Santos e a pavimentação da BR-163, em Mato Grosso, enfim, sairiam do papel.
De lá para cá, 1 trilhão de reais deixou o caixa da União, de estados, municípios, estatais e empresas privadas rumo a algum projeto do PAC. Mas ocrescimento não reagiu: neste ano, o PIB deve avançar 1%. Qual é, afinal, o problema? Na prestação periódica de contas, tudo parece em ordem na última, nada menos que 84% das obras estariam prontas ou dentro do prazo.
Só 5% levar
...Quando o Programa de Aceleração do Crescimento (pac) foi lançado em 2007, sua proposta era investir na infraestrutura para apressar o desenvolvimento. Obras esperadas há décadas, como a melhoria do acesso ao porto de Santos e a pavimentação da BR-163, em Mato Grosso, enfim, sairiam do papel.
De lá para cá, 1 trilhão de reais deixou o caixa da União, de estados, municípios, estatais e empresas privadas rumo a algum projeto do PAC. Mas ocrescimento não reagiu: neste ano, o PIB deve avançar 1%. Qual é, afinal, o problema? Na prestação periódica de contas, tudo parece em ordem na última, nada menos que 84% das obras estariam prontas ou dentro do prazo.
Só 5% levaram “luz vermelha”, o que indica uma situação preocupante. O difícil é aferir a contabilidade oficial. Ao longo de cinco anos, o PAC se tornou o guarda-chuva de uma miscelânea de 22 000 projetos.
Não existe relação entre a construção de quadras esportivas, a compra de petroleiros e a abertura de creches, mas tudo isso está no PAC. Aliás, hoje já há uma dezena de PACs filhotes como o da Copa, o das Crianças e o da Comunidade Cidadã. Para completar, em 2011 o PAC que deu origem à série foi substituído pelo PAC 2, com novos e velhos projetos. Boa parte das obras de infraestrutura que prometiam mudar a realidade do país foi de umPAC a outro, após estouros de custo e de prazo.
Juntas, essas obras representam quase 40% dos investimentos em infraestrutura em curso no país nos setores de energia, saneamento, transporte e recursos hídricos. As obras foram olhadas, uma a uma, para saber ao certo o estágio atual. O retrato é bem menos positivo. Só 7% delas foram concluídas, e a maioria 62% do total está atrasada. “O PAC virou uma caixa de obras aleatórias, sem um projeto de desenvolvimento por trás”, diz Paulo Fleury, diretor da Ilos.
O economista Gil Castello Branco, da ONG Contas Abertas, chama essas obras de barragens de riqueza. “Enquanto não são inauguradas, elas consomem recursos, mas criam poucos benefícios”, diz Castello Branco. “A transposição do rio São Francisco já recebeu quase 4 bilhões de reais e ainda não irriga nem um palmo de terra.”
De acordo com estimativa da Tendências Consultoria, feita, se o Brasil conseguisse melhorar sua infraestrutura, o país estaria em outro patamar. O PIB teria crescido 5,1% ao ano de 2007 a 2012 1,4 ponto percentual acima da média do período. “As obras geram mais riqueza depois de concluídas”, afirma Felipe Salto, economista da Tendências.
Não existe uma razão genérica que explique por que as obras se arrastam. “Há de tudo um pouco”, diz Édison Carlos, diretor do Trata Brasil. “Ineficiência na gestão, projetos malfeitos, leis confusas e corrupção.” Uma importante lição geral pode ser extraída do PAC. “Cada dificuldade para tirar uma obra do papel mostra uma ineficiência a ser combatida”, diz Richard Dubois, sócio da PwC Brasil. “Dado o diagnóstico, o que devemos fazer para melhorar?”
Na apresentação do último balanço do PAC 2, em 19 de novembro, a ministra do Planejamento, Miriam Belchior, disse que atrasos em obras públicas são “da regra do jogo”. Ou seja: para o governo, mais relevante que o atraso é destravar o projeto. “Temos técnicos nos canteiros identificando problemas para solucioná-los”, diz Maurício Muniz, secretário do PAC.
1 Transposição do rio São Francisco: nem foi inaugurada e já estragou
Por causa da pior seca do Nordeste em 30 anos, Sertânia, em Pernambuco, entrou no rodízio de abastecimento. Água na torneira só a cada 15 dias. Em Sousa, na Paraíba, a principal bacia leiteira do estado, o gado morre de fome e de sede. O preço do litro de leite subiu 30% para os paraibanos neste ano.
Hoje, 10 milhões de nordestinos, em 1 300 municípios, sofrem com a estiagem. O constrangedor é que boa parte deles incluindo Sousa e Sertânia poderia estar numa situação mais confortável se os benefícios da transposição do rio São Francisco tivessem saído do papel.
Já há dois anos a transposição deveria estar levando água a 12 milhões de pessoas em 391 cidades de quatro estados (Pernambuco, Paraíba, Ceará e Rio Grande do Norte) por meio de dois canais, chamados de eixos. O eixo norte, com 426 quilômetros, abasteceria o açude Engenheiro Ávidos (hoje com apenas 19% da capacidade), garantindo água a Sousa.
No entanto, apenas 26% do canal está pronto. O eixo leste, com 287 quilômetros, corta Sertânia, mas lá as obras estão paradas. Somente 51% do leste foi entregue. E pior: placas de cimento em ambos os canais racharam e precisam ser refeitas.
O que deu errado? Praticamente tudo, porque o básico não foi feito. As obras foram iniciadas sem o projeto executivo, que detalha o serviço a ser realizado. Essa prática, de fazer no improviso, é comum no Brasil e se mostrou um desastre no caso da transposição. Alegando custos inesperados, como escavar solo muito rochoso, as construtoras pediram reajustes.
Algumas deixaram o projeto. Muitos contratos também foram revistos porque o Tribunal de Contas e a Controladoria Geral da União flagraram irregularidades, como sobrepreços. “Tudo o que pode dar errado numa obra deu na transposição”, diz Gil Castello Branco, diretor da ONG Contas Abertas, que acompanha o PAC.
Resultado: o custo já chega a 8,2 bilhões de reais, 71% acima do previsto. Deveriam entrar na conta ainda os 2,7 bilhões que o governo desembolsa para aliviar os estragos da seca e poderiam ser poupados se a obra não tivesse atrasado.
2 Usina de Belo Monte: a usina-problema ficou para 2019
Nenhuma obra de infraestrutura no PAC ou fora dele é tão polêmica quanto a hidrelétrica de Belo Monte, no Pará. Além de atrair a antipatia dos ambientalistas, o projeto de mais de 30 anos é visto com reservas por empresas privadas. Grandes grupos desistiram de disputar a concessão porque consideraram o preço da energia, fixado pelo governo, insuficiente para remunerar o investimento.
No setor ainda se discute se o valor da obra, hoje em 29 bilhões de reais, não seria elevado para uma usina que terá variação na oferta de energia de 11 000 a 40 megawatts, dependendo da cheia e da seca do rio. Quase 90% dos acionistas da Norte Energia, o consórcio organizado de última hora que venceu o leilão, são empresas públicas ou sob influência de estatais.
Na fase de licenciamento, o Ibama demorou para autorizar a obra por ter encontrado lacunas no estudo de impacto ambiental. Nem o início dos trabalhos, em junho de 2011, deu sossego ao empreendimento: o canteiro já sofreu três invasões de índios, quatro greves de operários e uma paralisação a pedido do Ministério Público Federal do Pará.
O mesmo Ministério Público apresentou 15 ações contra a usina. Uma delas, à espera de julgamento no Supremo Tribunal Federal, pede a suspensão da obra para que os índios possam ser ouvidos novamente (apesar de a Funai ter feito 38 reuniões com eles). Hoje, uma espécie de “efeito Belo Monte” se alastra por outras obras de usinas do PAC na região amazônica.
As de Tapajós e Jatobá, no rio Tapajós, e a de Teles Pires, no rio de mesmo nome, são alvo de ações dos ministérios públicos. Se o governo não estabelecer um novo diálogo sobre o tema, a polêmica e o atraso só tende a crescer nas usinas do PAC.
3 Ampliação do Galeão: goteiras e urubus à espera das reformas
O Galeão, no Rio de Janeiro, é um dos aeroportos mais requisitados do momento. O número de passageiros cresceu 20% nos últimos 12 meses, enquanto a média nacional aumentou 8%. Mas é também um dos mais criticados. Entre os consultores de aviação, já foi chamado de favelinha.
Elevadores e escadas rolantes costumam parar. Quando chove, surgem goteiras. Até urubus já invadiram o saguão atravessando buracos no teto. As obras para a melhoria das instalações, incluídas no PAC, só pioraram sua imagem. As revisões no projeto de reforma do Terminal 1 atrasaram, e a obra só começou em setembro de 2012 quando já deveria estar pronta.
Na ampliação do Terminal 2, além de haver mais problemas com projetos, foram feitas 15 licitações: uma para a construção do prédio, outra para instalações elétricas, mais uma para a compra de painéis eletrônicos, e assim por diante. Como o custo máximo fixado pela Infraero sempre era menor que o considerado viável pelo mercado, as propostas extrapolaram o valor previsto, exigindo novas concorrências.
Algumas foram feitas três vezes. A Infraero atribui os atrasos à complexidade do processo de licitação e à morosidade das empresas que fazem os projetos. Os críticos dizem que a gestão da estatal é ineficiente. A empresa corre contra o tempo para provar que o problema não é ela: em 2011, o Galeão foi incluído numa lei especial que reduz a burocracia nas licitações.
Mas o prazo para a entrega de um Galeão mais apto a atender a Copa de 2014 está se esgotando. Com o tempo apertado, o governo finalmente parece estar se convencendo de que a saída é a concessão à iniciativa privada.
4 Acesso ao porto de Santos: Fazer só a metade não resolve
No capítulo transporte do PAC, a reforma da avenida perimetral no lado direito do cais do porto de Santos é uma obra relevante que já foi entregue. A conclusão, porém, não foi fácil nem encerra o problema de acesso aos terminais de carga. Um levantamento da consultoria Ilos, feito a pedido de EXAME, mostra que a obra sofreu nove revisões no prazo (foi entregue com quatro anos de atraso) e sete no investimento (custou 146 milhões de reais, quase o triplo do valor inicial).
Apesar de Santos ter ganho uma via mais ampla, a logística pouco mudou até agora. Para que a circulação de caminhões fluísse, o PAC deveria ter previsto a conclusão simultânea de dois outros projetos. Primeiro, a ampliação da avenida perimetral esquerda, no município do Guarujá. Ela começou em 2011, com dois anos de atraso, e depende da remoção de 3 000 famílias que ocupam uma área ao lado do terminal de contêineres. Também é essencial fazer o mergulhão, um túnel de 900 metros para interligar as duas vias, que ainda está no papel.
Além dos problemas em terra, há os do mar. O Programa Nacional de Dragagem investiu 170 milhões em 2010 e 2011 para aprofundar o canal do porto de 12 para 15 metros. A mudança permitiria que os navios acomodassem 1 300 contêineres a mais. Mas a Marinha, responsável por conferir o serviço, não validou a profundidade.
No setor se diz que já é preciso refazer a dragagem. Pior do que os atrasos nas obras é elas não terem o resultado esperado.
5 Ferroanel de São Paulo: trens de carga versus trens de passageiros
Entre as 9 e as 15 horas, a cena se repete 16 vezes todo dia: os passageiros nas estações à espera de um trem metropolitano na cidade de São Paulo ficam vendo a travessia de comboios carregados de minério, areia ou contêineres.
A rotina, bizarra para quem assiste, representa prejuízo para quem é obrigado a protagonizá-la. Um trem da MRS Logística que chega às 4 horas da manhã em Jundiaí, no interior do estado, fica parado 5 horas à espera de uma “janela” para poder cruzar a capital. E, quando segue, tem de ir a 10 quilômetros por hora no trecho urbano.
Trens de carga e de passageiros compartilham os trilhos há 18 anos, mas a convivência é cada vez mais complicada. O número de usuários da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos dobrou para 2,6 milhões por dia nos últimos cinco anos e espremeu os horários do transporte de carga.
A solução é conhecida há mais de 20 anos: a construção de arcos ferroviários contornando a capital paulista ao norte ou ao sul. A proposta de fazer o chamado ferroanel entrou no primeiro PAC, em 2007, como uma prioridade. Mas segue no PAC 2 desde 2011 como obra não detalhada. Em agosto, passou a figurar também no recém-lançado Plano Nacional de Logística e Transporte sem que se tenha definido o traçado até agora.
A razão para a falta do projeto é política. Os governos federal e estadual sempre disputaram qual trecho seria o mais importante e quem arcaria com a obra avaliada pela administração paulista em 3,5 bilhões de reais. A União prefere o norte, para atender mineradoras. O governo de São Paulo quer facilitar o acesso de produtos agrícolas pelo sul.
A indecisão empurrou a carga para as rodovias. Atualmente, 97% dos contêineres chegam ao porto de Santos em caminhões. Caso tivesse seguido o cronograma do PAC 1, os primeiros trens de carga estariam contornando a capital nesse momento. Além de poder rodar 24 horas, as composições poderiam manter uma velocidade média de 60 quilômetros por hora. E seria possível dobrar o volume de 35 milhões de toneladas de carga por ano que cruza São Paulo de trem.
6 Ferrovia Norte-Sul: 25 anos sob a marca da corrupção
Está na página 55 do quinto balanço do PAC 2: “Ferrovia Norte-Sul, trecho entre Palmas e Anápolis (GO) em execução”. O balanço foi apresentado pelo governo em 19 de novembro. Mas, nesse mesmo dia, no canteiro de obras da ferrovia em Anápolis, visitado por EXAME, não havia máquinas, operários nem sequer um vigia.
O único movimento que se via por ali era da água que brotava no túnel da estrada de ferro sob uma rodovia. O trecho Palmas-Anápolis, de 855 quilômetros, está 87% concluído, segundo o balanço do PAC. Mas, na prática, continua 100% inútil.
A Norte-Sul, com quase 3 000 quilômetros previstos do Pará a São Paulo, foi concebida para ser um eixo de linhas férreas no país. Hoje, um quarto de século depois, a maior parte dela continua na promessa apenas 720 quilômetros estão operando. A construção começou em 1987.
Desde então, a corrupção tornou-se sua marca. A licitação inicial foi considerada fraudulenta e precisou ser refeita. As irregularidades e a falta de verba fizeram a obra andar aos soluços. O atual trecho inacabado, entre Palmas e Anápolis, é a soma de gestão ineficiente e corrupção.
Em julho, indícios de desvios de recursos na Valec, estatal que cuida da obra, derrubaram a cúpula da empresa. Isso agravou o atraso causado pela demora na análise dos aditivos pedidos pelas empreiteiras responsáveis pela obra. A espera fez a licitação expirar. Agora, à espera de nova licitação, a construção está parada.
Há ainda denúncias de superfaturamento. As evidências fizeram o Tribunal de Contas da União recomendar o congelamento do dinheiro para a Norte-Sul que, com isso, corre o risco de ficar sem recursos do orçamento em 2013. Nada é tão ruim que não possa piorar.
7 Duplicação da BR-101: a duplicação mais demorada da história
Aobra no trecho sul da BR-101, em Santa Catarina, é candidata a um recorde a duplicação de rodovia mais demorada da história do país. O trajeto de apenas 238 quilômetros entre Palhoça (na Grande Florianópolis) e Passo de Torres (na divisa com o Rio Grande do Sul) foi licitado em 2004, mas não será concluído até 2015 algo que equivale a asfaltar em média 22 quilômetros por ano.
A Federação das Indústrias de Santa Catarina traça cenário pior: a obra vai até 2017 porque uma ponte e os dois túneis que faltam vão dar trabalho. Para comparação, a China constrói 35 000 quilômetros de rodovias por ano.
Parte do atraso ocorreu por causa de sucessivas revisões de projetos, preços e prazos, muitos deles solicitados pelas construtoras. O lote 29, entre Araranguá e Sombrio, é um exemplo. Os seus 28 quilômetros foram arrematados por 103 milhões de reais (um deságio de 40%) pela construtora DM. Um ano e meio depois, a empresa abandonou a obra alegando dificuldades financeiras. Fez apenas 3% do serviço.
A segunda colocada, a construtora Triunfo, assumiu os trabalhos em 2007, quando a obra entrou no PAC, mas se retirou em menos de um ano com o mesmo argumento. A terceira colocada, a Construcap, não quis tocar a obra. Em 2010, o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), órgão do Ministério dos Transportes, ampliou o projeto e abriu nova licitação.
Um consórcio liderado pela mesma Construcap levou o trecho por 276 milhões de reais 168% mais do que o valor inicial. Ainda inacabado, o trecho é chamado de “lote da vergonha”. O Dnit atribui o atraso aos deságios. “Quando os editais foram lançados, havia poucas obras, e as construtoras ofereceram descontos grandes para vencer.
Depois, tiveram problemas na execução”, diz João José dos Santos, superintendente do Dnit em Santa Catarina. Segundo César Smielewski, vice-presidente da Associação Empresarial de Criciúma, a principal cidade do sul do estado, a região perde 3 bilhões de reais por ano com a BR-101. No verão, a pista recebe 30 000 veículos por dia o dobro da capacidade. O dramático é a perda de investimentos. “O representante de uma metalúrgica italiana desistiu da região após ficar preso 7 horas num congestionamento”, diz Smielewski.
8 Arco Metropolitano do Rio: faltou incluir uma travessia para as rãs
Quase 10 000 caminhões atravessam a cidade do Rio de Janeiro diariamente rumo a São Paulo, Minas Gerais e Espírito Santo. Eles engarrafam vias importantes, como a avenida Brasil. A ideia de desviar o tráfego pesado com a criação de um anel viário em torno do Rio foi concebida ainda na década de 70. Resgatar a ideia e incluí-la no PAC em 2007 foi uma boa iniciativa. Em tese, o Arco deveria ser uma obra mais tranquila. Metade dos 145 quilômetros é composta de rodovias que já existem. Só 71 quilômetros precisam ser feitos do zero.
Ocorre que, na ânsia de tirá-lo do papel, deixou-se de lado um procedimento importante: adequar o projeto às mudanças que ocorreram na região e nas leis nos últimos 40 anos. Foi preci¬so fazer mais de 2 000 desapropriações porque o traçado passa por áreas já ocupadas.
E, apesar de a legislação ambiental ter se tornado rigorosa, o estudo do impacto sobre o meio ambiente desconsiderou uma espécie rara de rã. Conhecida desde a década de 60, ela vive na floresta nacional cortada pelo Arco. Nesse trecho, a obra está parada desde 2010 e as negociações com o Instituto Chico Mendes de Biodiversidade definiram que será construído um viaduto sobre o trecho em que as rãs transitam cuja construção ainda nem co¬meçou.
No trajeto também pipocaram quase 70 sítios arqueológicos. Nesses pontos, quem interfere é o Instituto de Arqueo¬logia Brasileira com uma burocracia rígida: peças encontradas em um ano só podem ser removidas no ano seguinte. A falta de previsão dos contratempos cobra seu preço. O custo da obra já passa de 1 bilhão de reis.
9 Pavimentação da BR-163: na “rodovia sem fim”, a espera persiste
Os 3 500 quilômetros da BR-163 se estendem do Pará ao Rio Grande do Sul. Em todo o Brasil, a metade Norte é chamada de Cuiabá-Santarém. Os usuários mais frequentes e íntimos da estrada, no entanto, lhe deram outro apelido “rodovia sem fim”. Foi o jeito encontrado para criticar quatro décadas de promessas nunca cumpridas de que o trecho vai ser asfaltado e, de fato, exercer a função que lhe cabe: funcionar como um corredor de exportação dos grãos do Centro-Oeste.
A pavimentação do trecho Norte da BR-163 foi incluída com entusiasmo renovado na primeira versão do PAC, em 2007. Previu-se na época que os 1 000 quilômetros entre Santarém e a divisa do Pará com Mato Grosso, considerados os mais problemáticos, estariam prontos em 2010.
Até agora, porém, apenas 30% do trajeto está concluído. Do 1,5 bilhão de reais em investimentos previstos para a estrada, 752 milhões de reais foram gastos. Um dos motivos para os atrasos é a série de aditivos aos contratos pedidos pelas empreiteiras. Com a demora na análise dos pedidos, as obras param. Também pesaram contra projetos malfeitos e sinais de irregularidades detectados pelo Tribunal de Contas da União, os quais levam a novas paralisações.
Se já estivesse asfaltada, a rodovia baratearia 35% o frete da região produtora até o navio para um quarto da soja colhida em Mato Grosso. Os portos do Pará ficam mais perto de boa parte das lavouras. “Do norte de Mato Grosso até Santos, o frete custa 125 dólares por tonelada”, diz Edeon Vaz Ferreira, coordenador executivo do Movimento Pró-Logística. “Nos Estados Unidos, num percurso mais longo, o frete das fazendas até os portos custa 10 dólares por tonelada. Como vamos competir com isso?”
10 Saneamento em Belém: não planejou? Comece de novo
Abaixada da Estrada Nova, nome popular da avenida Bernardo Sayão, na periferia de Belém, no Pará, não tem nada de novo. É o retrato do que há de mais velho e atrasado no Brasil. Ali se aglomeram, na maior favela da cidade, mais de 53 000 pessoas. A visão é impressionante.
Os barracos de madeira se equilibram sobre igarapés tomados pelo lixo e pelo esgoto. As ruelas que servem de passagem entre as casas são pontes de pau a pique sobre a água contaminada e malcheirosa. Nessa região, a Pastoral da Criança já não se preocupa com a desnutrição.
O aumento da renda entre os mais pobres garante a compra de comida, inclusive de biscoitos e refrigerantes que hoje fazem com que boa parte das crianças esteja obesa. Os maiores males são a febre e a diarreia provocadas pelo convívio com o esgoto. O mais dramático é que a Estrada Nova é apenas a face mais chocante de um problema recorrente.
Em Belém, 45% das residências convivem com o esgoto a céu aberto, e onde ele não é visto na superfície é acomodado no solo. Prédios modernos de bairros nobres ainda utilizam fossa porque nem 10% da cidade está ligada à rede de esgoto.
O PAC promete mudar essa realidade desde 2008, quando a cidade incluiu no programa a recuperação e a ampliação das estações de tratamento de esgoto. As obras, porém, não ocorreram. Para receber os 55 milhões de reais previstos, a prefeitura de Belém precisava renovar o contrato com a Companhia de Saneamento do Pará, que estava vencido.
Na renovação, os serviços, antes compartilhados com um órgão municipal, seriam entregues na íntegra à empresa do estado. O acordo demorou mais de um ano e, quando saiu, em março deste ano, as licitações foram canceladas porque os projetos estavam defasados. Segundo o Instituto Trata Brasil, Belém não é exceção.
“Quando o PAC foi lançado, as prefeituras correram para inscrever seus projetos, mas a maioria não estava preparada para receber o dinheiro nem entende a importância de resolver logo a falta de saneamento”, afirma Édson Carlos, presidente do Trata Brasil. “Ao que tudo indica, o aprendizado será longo.”
“Quando o PAC foi lançado, as prefeituras correram para inscrever seus projetos, mas a maioria não estava preparada para receber o dinheiro nem entende a importância de resolver logo a falta de saneamento”, afirma Édson Carlos, presidente do Trata Brasil. “Ao que tudo indica, o aprendizado será longo.”
16 de abril 2020
16 de abril 2020
Av. Francisco Matarazzo, 404 Cj. 701/703 Água Branca - CEP 05001-000 São Paulo/SP
Telefone (11) 3662-4159
© Sobratema. A reprodução do conteúdo total ou parcial é autorizada, desde que citada a fonte. Política de privacidade