Valor Econômico
04/07/2025 10h09
A Medida Provisória (MP) que elevou a tributação das debêntures incentivadas tem gerado forte preocupação no setor de infraestrutura, principalmente nas empresas que conquistaram concessões recentemente.
A mudança deverá impactar novos leilões, mas a situação é pior para grupos que venceram licitações com uma expectativa de custo de capital e, agora, terão que enfrentar taxas mais altas, segundo fontes.
É o caso de diversos operadores de transportes, energia e saneamento, como o consórcio 4UM – Opportunity, que neste ano arrematou a concessão da Rota Agro Norte em Rondônia; a
...A Medida Provisória (MP) que elevou a tributação das debêntures incentivadas tem gerado forte preocupação no setor de infraestrutura, principalmente nas empresas que conquistaram concessões recentemente.
A mudança deverá impactar novos leilões, mas a situação é pior para grupos que venceram licitações com uma expectativa de custo de capital e, agora, terão que enfrentar taxas mais altas, segundo fontes.
É o caso de diversos operadores de transportes, energia e saneamento, como o consórcio 4UM – Opportunity, que neste ano arrematou a concessão da Rota Agro Norte em Rondônia; a EPR, que desde 2022 conquistou seis operações de rodovias; a Aegea, que só no último ano conquistou três grandes contratos no Pará e um no Piauí; entre outros. Em ferrovias, a Rumo também é apontada como uma afetada, por sua obra de expansão no Mato Grosso.
A Motiva (ex-CCR) também é uma das potenciais grandes prejudicadas, segundo fontes.
Além de ter conquistado projetos recentemente, o grupo fechou em 2024 um financiamento volumoso, de mais de R$ 9 bilhões em debêntures incentivadas junto ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), mas com liberação de recursos em fases, à medida que as obras avançam – a interpretação é que, pela redação atual da MP, as próximas tranches seriam tributadas com as novas regras.
No geral, a mudança frustra tanto grupos que precisam financiar a outorga dos leilões e os primeiros investimentos, quanto aqueles que já têm um empréstimo-ponte de curto prazo e estão negociando o contrato de longo prazo, dizem fontes do mercado, que pediram anonimato.
Para estes últimos, a situação é ainda pior porque há também o efeito de alta dos juros, observa uma delas. Alguns grupos têm buscado antecipar as emissões para este ano, antes que a alteração entre em vigor, mas isso não é possível para todos, afirmam.
A MP, publicada em junho, alterou a tributação de debêntures incentivadas, além de outros títulos. Para pessoas físicas, que eram isentas, os ganhos ficarão sujeitos a de 5% de Imposto de Renda (IR) a partir de 2026.
Para pessoas jurídicas, o texto abriu diferentes interpretações, mas já há quase um consenso de que a alíquota passará de 15% para 25%. “Alguns entenderam que a tributação ficaria em 17,5%, mas não acho que seja uma leitura adequada”, avalia Luiz Rosa, sócio tributarista do Machado Meyer.
O setor de rodovias calcula que a taxa média das emissões subirá 2 pontos percentuais com a MP, segundo Marco Aurélio de Barcelos, presidente da Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR). A conta considera que o atual spread médio de 7,3% saltaria à faixa de 9,3%.
O texto da MP, porém, ainda passa por debate no Congresso Nacional e poderá mudar, destaca Luciana Costa, diretora de infraestrutura, transição energética e mudança climática do BNDES. Ela avalia ser cedo para dimensionar o impacto sobre o spread.
Costa afirma que a lei deverá manter as condições dos contratos vigentes. “A MP vai proteger todos os projetos já contratados, não existe risco de rediscutir termos e condições já contratados”, diz.
No setor de rodovias, já começa a se cogitar uma onda de pedidos de reequilíbrio econômico-financeiro caso concessionárias tenham suas projeções de custo financeiro frustradas, embora não se trate de uma discussão regulatória fácil. “Havia uma lei que previa o regime tributário, os grupos se prepararam para leilões pressupondo um arcabouço legal”, diz Barcelos. “A MP deveria preservar operações e leilões anteriores à mudança.”
Já em relação a leilões futuros, Costa, do BNDES, afirma que as alterações não deverão inviabilizar o custo das debêntures. A diretora diz que, mesmo com a alta dos juros, os investimentos de infraestrutura seguem em alta. “Os investidores miram o longo prazo, e dados apontam a queda dos juros.”
Fontes de bancos, que falaram sob condição de anonimato, avaliam que de fato projetos futuros têm vantagem, por já preverem o novo cenário. “Você coloca na conta e segue em frente”, diz uma delas. Já outros avaliam que o cálculo tende a ficar mais apertado.
Para as fontes, o maior impacto virá do aumento da tributação para pessoa jurídica, dado que, na maior parte das emissões, os bancos não distribuem os papéis de uma vez e “carregam” parte dos títulos até que sejam alocados.
O texto traz um desincentivo para isso, porque além da alta na alíquota, a MP também acaba com outro benefício que era dado às pessoas jurídicas: antes, o rendimento das debêntures não entrava na apuração de lucro sujeita a tributação de IR, mas agora passará a compor esse cálculo. Portanto, “carregar” os títulos ficará mais caro aos bancos.
Apesar das preocupações, Costa rechaça o temor de parte do setor de que a MP crie um desincentivo ao mercado de capitais e o financiamento da infraestrutura volte a se concentrar no BNDES. “Não queremos voltar ao passado. O banco prefere coexistir com o mercado porque não quer correr sozinho o risco de projetos grandes.”
Em meio à discussão da MP no Congresso, há de fato expectativa de ajustes. “A MP recebeu mais de 600 emendas, há muitas sugestões. E há tempo para discussão”, afirma Rosa, do Machado Meyer.
Procurada, a Motiva diz que “caso o texto atual da MP seja mantido, representará um desincentivo para a captação de recursos a custos competitivos, afetando a financiabilidade dos projetos”. Procurados, a Rumo, o consórcio da 4UM, a Aegea e a EPR não comentam.
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