Aos 89 anos, o professor Augusto Carlos Vasconcelos, ainda é capaz de surpreender. Conhecido como estudioso do concreto no Brasil, ele tem vitalidade para acompanhar as constantes transformações do mercado, não só do concreto, mas principalmente da Engenharia. E logo de início, na conversa em seu apartamento em Higienópolis, a repórter e ao fotógrafo, ele se declara: “Eu sempre fui atrás das inovações”. Ainda hoje é um apaixonado pelo lado mais ousado da Engenharia, aquele que ousa trilhar novos caminhos em busca de aperfeiçoamento. Os seus olhos brilham ao falar das mudanças tecnológicas que ainda virão por aí. Conversar com o professor Vasconcelos deveria ser uma aula obrigatória a todos os estudantes de Engenharia, aliás, por que não, a qualquer pessoa que não se satisfaça com as respostas prontas que estão colocadas. “Sempre há o que ser melhorado”, ensina.
Ao longo de toda sua vida, ele nunca ficou doente, diz. Somente neste ano é que teve uma complicação pulmonar, que o obrigou a ficar internado por mais de um mês. Por conta disso, ele faz exercícios em casa como recomendação médic
Aos 89 anos, o professor Augusto Carlos Vasconcelos, ainda é capaz de surpreender. Conhecido como estudioso do concreto no Brasil, ele tem vitalidade para acompanhar as constantes transformações do mercado, não só do concreto, mas principalmente da Engenharia. E logo de início, na conversa em seu apartamento em Higienópolis, a repórter e ao fotógrafo, ele se declara: “Eu sempre fui atrás das inovações”. Ainda hoje é um apaixonado pelo lado mais ousado da Engenharia, aquele que ousa trilhar novos caminhos em busca de aperfeiçoamento. Os seus olhos brilham ao falar das mudanças tecnológicas que ainda virão por aí. Conversar com o professor Vasconcelos deveria ser uma aula obrigatória a todos os estudantes de Engenharia, aliás, por que não, a qualquer pessoa que não se satisfaça com as respostas prontas que estão colocadas. “Sempre há o que ser melhorado”, ensina.
Ao longo de toda sua vida, ele nunca ficou doente, diz. Somente neste ano é que teve uma complicação pulmonar, que o obrigou a ficar internado por mais de um mês. Por conta disso, ele faz exercícios em casa como recomendação médica. O médico recomendou-lhe fazer exercícios de fisioterapia para respiração e para os músculos durante seis meses. “Como eu fiquei muito tempo no hospital, fiquei com os músculos meio paralisados, e não estavam mais obedecendo”.
Aos quase 90 anos de idade, que completará em outubro, Vasconcelos mantém uma rotina de trabalho e social, que muito o orgulha. Ele diz que semanalmente comparece às reuniões do Instituto de Engenharia, onde reencontra os amigos, divide uma pizza, conta piadas, troca experiência. Frequenta também o Ibracon (Instituto Brasileiro do Concreto) e a ABCP (Associação Brasileira do Cimento Portland). E para se prevenir do mal de Alzaimer, todos os dias exercita a mente com os exercícios matemáticos de Sudoku.
Lembra-se dos congressos mundiais da Fib (Federação Internacional do Concreto), em que era um dos dois representantes brasileiros a participar, sempre com recursos próprios. Ele participou de todos os congressos de 1987 a 1995. Apesar de ser um dos ícones do concreto no Brasil, responsável por trazer as primeiras informações mais consistentes sobre o concreto protendido, o destino do professor Vasconcelos cruzou com o concreto por acaso do destino. A opção inicial do jovem carioca, com passagem por Santos, desaguado em São Paulo, foi pela Engenharia Elétrica, justamente por causa do grande interesse que ele tinha pelas disciplinas de Física, Química e Matemática. “Eu me interessava pelo funcionamento das coisas”.
Um emprego no Instituto de Pesquisas Tecnológicas acabou roubando o jovem recém-formado dos trilhos da eletricidade, para os caminhos incautos da construção. Na época, início da década de 1940, o concreto já era um material largamente utilizado, mas experimentava novas pesquisas e ensaios para dar conta da onda industrializante que se expandia pelo mundo. Empregado no IPT, o engenheiro acabou voltando para a faculdade para fazer as aulas que lhe dariam o título de Engenheiro Civil. Logo sairia do IPT para trabalhar como assistente na Escola Politécnica, primeiro na área de cálculo diferencial integral, depois passando para a área de resistência dos materiais, onde ficou por oito anos. A Física dava lugar definitivamente à Mecânica.
Lá teve acesso às profundezas tecnológicas do concreto. Como em tudo que faz, Vasconcelos foi se apaixonando sobre os desafios proporcionados pelo uso do material, que ensaiava novos vôos tecnológicos depois de 100 anos de surgimento. As propriedades, e possibilidades, mecânicas do material e sua expansão na construção passavam por novos, e foi nesse ponto em que houve um casamento de interesses com Vasconcelos.
Com suas duas formações, Engenharia Civil e Elétrica, a pesquisa em torno do Cálculo Estrutural, que o levou aos braços do Concreto Protendido, Armado e Pré-fabricado, aproximaram o jovem à sua área de interesse inicial, que era conhecer e investigar os limites quântico e físicos dos materiais. “Caí para a área do concreto e não voltei mais. Então, posso dizer que a vida nos leva a situações que a gente não imagina”.
O destino de Vasconcelos já estava marcado? Pode ser. Ele se lembra de que, quando estudante, morava numa pensão e recebia os primeiros boletins sobre concreto produzidos pela Associação Brasileira de Concreto Portland. Colecionou essas publicações, mas ao se formar pensou: “eu não vou usar isso”. E deu de presente o volume encardenado para colegas da engenharia do Mackenzie que também moravam na pensão. “Por isso hoje eu não tenho mais a coleção completa da ABCP”, lamenta-se.
Vasconcelos nasceu na cidade do Rio de Janeiro, mas o destino mudou a trajetória do garoto que desde de cedo gostava de praia. “A minha mãe enviuvou muito cedo e quando cheguei aos 10 anos de idade ela se casou com uma pessoa da cidade Santos e nós mudamos para lá... Frequentei o ginásio dos irmãos Maristas e vim para São Paulo fazer o vestibular . E não sai mais daqui. Eu nunca imaginei que viesse morar aqui, em São Paulo. Assim como também não planejei trabalhar com concreto. Aconteceu. Meu negócio sempre foi o de “deixa a vida me levar”, como diz a música do Zeca pagodinho...”
E isso aconteceu. A vida o levou para Alemanha, com uma bolsa de estudos, no início da década de 1950, para o centro de Munique, em plena época de reconstrução do país pós-guerra. “Era uma época das revoluções. A primeira norma técnica sobre o concreto surgiu em 1940 e eu recebi o diploma de engenharia civil em 1948. Nessa época, o concreto protendido ainda não era lecionado nas faculdades de engenharia civil. Falava-se em concreto protendido como uma coisa nova, mas que nem fazia parte do currículo escolar”, comenta.
Vasconcelos chegou a Alemanha em 1954 para fazer pós graduação no campo das estruturas, mas interessou-se também pelo curso de concreto protendido dado pela segunda vez pelo professor Hubert Rüsch. “Pensei: não vou perder essa oportunidade e me matriculei no curso”. Sem saber, isso modificaria bastante o seu destino. Mais tarde, ao voltar ao Brasil, ele traduziria essas apostilas e começaria a dar uma versão do curso no país de maneira inédita, fora do currículo da Escola Politécnica.
“Um curso de pós graduação sobre concreto protendido era coisa nova. Ninguém tinha noção daquilo. As primeiras construções brasileiras de concreto protendido foram feitas com projetos franceses entre 1947 e 1949. Mas um era algo bem eliminar “mas” diferente. Não existia nada didático no país até então, principalmente sobre concreto protendido. Então depois que voltei, em 1955, eu repeti as aulas do professor Rüsch pela primeira vez no Brasil, em 1956”, lembra.
A Europa em reconstrução
Vasconcelos chegou à Europa no início da década1950, quando a Europa enfrentava a difícil tarefa da reconstrução. A bolsa de estudos chegou ao estudante poucos meses antes dele completar 30 anos, idade máxima para os bolsistas. A Alemanha, mesmo destruída, ainda sim era a incubadora das diversas tecnologias que estariam por vir. Lá, além de aguçar seu interesse pela Engenharia, teve a oportunidade de ampliar seu gosto musical, frequentando os teatros e óperas da cidade.
“Munique estava destruída. As avenidas principais tinham casas de cinco ou seis andares cuja a parte frontal tinha sido detonadas por bombardeios. Os moradores colocavam uns tabiques de madeira para vedar a cobertura, por causa do frio do inverno, a 20º graus abaixo de zero. Eles aqueciam as casas com com biquetes de carvão. Ou seja, era um momento de plena reconstrução do país, mas ao mesmo tempo a cidade mantinha a sua cultura. A ópera não foi destruída e ainda havia muitos concertos. E eu frequentei muito essas óperas, assisti a muitos concertos. Tive essa sorte, pois adorava música clássica. Tudo isso foi muito proveitoso para mim do ponto de vista cultural, musical e do aprendizado da língua, pois não tenho origem alemã. No diploma do meu curso, recebi a segunda nota, não foi a primeira, mas foi a segunda, “Muito Bom”. Tenho orgulho disso e me dei muito bem com essa tese”, comenta.
Na época, muitas pontes estavam sendo reconstruídas ou substituídas utilizando o concreto protendido, que permitia alcançar vãos maiores além de serem mais econômicas. Mas, devido ao ineditismo do processo, os professores das universidades, como Rüsch, foram encarregados de verificar esses projetos. Confiando no interesse do aluno tão distante, o professor começou a emprestar-me essas verificações para estudo. Vasconcelos passou a anotar muitas dessas informações, inclusive as anotações do professor, que lhe dariam subsídio para os seus estudos sobre estruturas, pontes e concreto. “Eu tive a felicidade de estar na Alemanha nessa época, em que os projetos precisavam ser verificados. Aproveitei esse momento e isso me ajudou muito”, destaca.
Depois dessa trajetória, e da volta ao Brasil, a vida de Vasconcelos passaria a girar em torno do concreto. Ele passou a dar um curso e compilar as informações sobre o assunto, dedicando-se a difundir as informações através de textos, artigos, livros, e uma ampla produção historiográfica sobre o assunto. Uma destas publicações é a Coletânea de Trabalhos Técnicos, com várias de seus trabalhos tendo como foco a história e evolução do concreto no Brasil. Dentre os capítulos, ele destaca o que abordam as normas técnicas, a história do concreto protendido, a história do cálculo eletrônico, o concreto armado, a evolução da tecnologia no Brasil, as primeiras obras e realizações, os pré-fabricados e curiosidades – leitura obrigatória para os estudantes de engenharia. Ele faz questão de destacar que todos os seus trabalhos contam com bibliografia. “Eu não cito nada sem mencionar a origem para não dizerem que aquilo foi apenas suposição diz acautelando-se.
Quem inventou o concreto armado?
A seu ver, um dos pontos mais marcantes da história do concreto está justamente na sua origem. Inclusive escreveu um artigo: Quem merece a glória de ter inventado o concreto armado? Lambot, Hyatt, Monier, Hennebique ou Waiss? onde conta como o primeiro, Lambot, descobriu o material mas não a dimensão de sua invenção; Hyatt experimentou o material em módulos empregados na construção, mas continuou no escuro sobre seu potencial; Hennebique dedicou a estudá-lo e experimentá-lo sem levar suas ideias ao conhecimento público. Coube aos alemães focarem na pesquisa, testes e ensaios, que dissecaram o potencial técnico do material e finalmente atribuiu-lhe os verdadeiros limites técnicos e estruturais possíveis para a Engenharia.
Vasconcelos faz questão de ressaltar que, a seu ver, o mais importante em sua trajetória foi seu interesse permanente por novos conhecimentos. “Eu sempre me interessei por coisas novas. É muito raro ver uma pessoa que queira aplicar coisas novas. De um modo geral, os engenheiros antigos não querem saber de novidades. Gostam de fazer algo, fazem bem, mas não querem mudar. Eu já sou diferente. Tudo que aparece de novidade eu quero conhecer”, comenta.
Assim foi em sua vida, quando seguiu para a Alemanha para desenvolver a fotoelasticidade – que é a maneira de estudar experimentalmente as estruturas. “Minha tese na Alemanha versava sobre Concreto Armado estudado de forma experimental, comenta. O sistema de verificação em estudo na época era por via ótica, utilizando a fotoelasticidade. “Hoje se faz isso com computadores de maneira mais rápida até. Mas naquela época não existia o computador. Para saber quais eram os esforços que apareciam em peças de forma irregular, tinha que ser por via experimental. E foi isso que fui buscar na Alemanha: o objetivo era determinar todas as tensões, todos os esforços internos, mediante modelos transparentes, colocadas num aparelho de luz polarizada. Na época isso era uma novidade com modelos contendo armaduras, lembra.
O aguçamento crítico de Vasconcelos não tinha fim. Logo surgiu a alvenaria armada que o atraiu. “Quem começou a fazer isso no Brasil, foi uma empresa chamada Prensil, utilizando blocos sílico-calcários, que tinham resistência maior. Como não tinham prática de fazer esses projetos, usavam as publicações alemãs e me pediram para fazer os cálculos. O sistema não pegou muito por ser mais caro. Então começaram a usar os tijolos comuns mas com ferro dentro, como faziam os americanos. Eu fiz muita coisa em alvenaria armada, pois estava sempre procurando fazer coisas novas e assimilar o que estava surgindo”.
Em seguida, surgiu o concreto leve. “Muitas firmas queriam substituir o uso da pedra na produção do concreto. Então surgiram os agregados de argila expandida. No Brasil quem trouxe isso foi a Cinasa, ainda na década de 1970. Eu fiz os cálculos de todas as peças protendidas que eles produziram utilizando programas de computador. Aliás, também foi a primeira vez que se fazia cálculos de peças padronizadas utilizando um sistema computacional. Era ideia similar ao conceito de concreto armado , mas com agregado leve. Hoje, esses agregados de argila são mais conhecidos pelo uso em paisagismo, nas floreiras, e para desbotar jeans, mas na época foi uma inovação”.
Na Alemanha só se usava esse tipo de material para construir projetos de grandes vãos, quando o peso do concreto podia chegar a 2.500 kg por m³. “Era muito pesado, então a pedra britada foi substituída por essas bolinhas de argila, e o concreto resultante tinha a densidade de 1500 kg por m³. Essa redução de peso permitia executar vãos maiores. Assim, eu fiz muitos cálculos para obras da Cinasa utilizando o concreto leve estrutural”, conta.
As inovações nunca pararam e posteriormente surgiu o concreto armado com fibras – que é muito aplicado hoje. Antes utilizadas fibras de vidro adicionada ao concreto para fabricar peças leves. Mas as fibras de vidro eram atacadas pelo álcalis do concreto. Os álcalis do concreto combinam com o vidro produzindo silicato e isso destrói praticamente a fibra, explica ele. Emprega-se a fibra de vidro e resina atualmente para fazer móveis. Mas como não era apropriado para o concreto, passaram a usar a fibra metálica.
“Isso já tem mais de 10 anos. Mais recentemente começou-se a utilizar arames fininhos adicionados ao concreto. As pontas desses arames de 3 a 4 cm são dobradas em forma de cavalete, formando uma figura em trapézio. E são colocadas em grande quantidade dentro do concreto, em substituição aos ferros grossos. Quem fez isso foi a Dramix, do grupo Belgo Mineira. Montaram inclusive uma fabrica especial para produzir essas fibras”, conta.
“Eu dei assessoria durante algum tempo para essa fabrica. Ou seja, em tudo quanto era novidade eu estava presente: foi assim com o concreto protendido, depois o concreto leve, alvenaria armada, uso de fibras no concreto. Em todos esses casos em participei de alguma forma. Não me detive em nada com vigor permanente, mas dei uma participação a cada caso. Evolução é isso, aproveitar os materiais e inovações que vão surgindo para seu aperfeiçoamento, lembrando que a questão do concreto está sempre ligada ao peso, custo e produtividade”.
O concreto protendido surgiu principalmente como maneira de aliviar o peso, conta. “Com protendido, era possível fazer peças mais longas diminuindo as seções. Com o efeito das protenções de cabos esticados dentro do concreto, era possível diminuir as dimensões da peça”. Isso permitiu fazer peças mais esbeltas com a mesma capacidade de resistência e com vãos maiores. E possibilitou ter peças mais duráveis porque com as peças não fissuravam em serviço. “Era possível colocar as peças com a carga máxima e não apareciam fissuras. As deformações eram menores, e as deformações sendo menores, a durabilidade era maior. Ganhava-se muito em durabilidade, em peso das peças, em aspecto estético. Dava para fazer vãos maiores, e peças mais reduzidas, o que os arquitetos adoravam”, conta o professor didaticamente.
Mas porque essa disputa entre estruturas de aço e de concreto?
“O concreto armado surgiu na França em 1847 e completou 100 anos em 1947. Em 1950 os franceses fizeram uma edição comemorativa do material, enaltecendo a sua durabilidade muito grande. Entraram com a afirmação de que o concreto era durável, sem necessitar de manutenção, e o concreto teve essa expansão toda. Mas isso foi a partir de uma mentira. Não é durável. Se for bem feito, ele pode ser durável. Mas do jeito que vinha sendo feito, na época, o concreto tinha a durabilidade de 20 ou 25 anos. E começaram a aparecer obras com o concreto totalmente deteriorado, o que fez com que ele perdesse um pouco do seu prestígio”, conta o professor.
“Perceberam que não podiam colocar qualquer tipo de armadura no concreto, qualquer dimensão, porque a fissura ia fazer com que entrasse umidade por dentro e corroesse o ferro. Ou seja: uma mentira dizer que o concreto era durável e não precisava de manutenção nenhuma. Isto foi o que deu prestígio ao concreto”, diz ele. “As estruturas de concreto precisam sim de manutenção!”.
Por isso, explica ele, atualmente um dos capítulos das Normas Técnicas em vigor é todo dedicado à Durabilidade, em que se destacam os itens para assegura a durabilidade do material ao longo de sua vida útil. “Infelizmente é preciso acontecer alguma coisa para o pessoal se levar os riscos a sério”.
Ele lembra o caso de um edifício de 15 andares, em Maringá, em 1957, que tinha uma pequena sacada de 1,5 m. No último andar, fizeram uma cobertura para cobrir a sacada de baixo. Mas uma infiltração começou a ocorrer ali. “O prédio teve cálculo correto, assim como as sacadas. Mas a umidade da cobertura conseguiu atingir a armadura naquele ponto, e fez com que aquele pedaço da laje rompesse após uma tempestade mais forte. Resultado: a laje venceu e foi atingindo as demais sacadas uma a uma, até chegar ao térreo, conta.
A falência de um segmento da laje causou a propagação do desastre por 15 andares. Isso é que se chama de colapso progressivo, explica, lembrando novos desastres ocorridos no Rio de Janeiro e em São Bernardo. “É contra esse tipo de colapso progressivo que se deverá projetar as estruturas no futuro pensando em como prever um desastre como esse. Mas isso teria um custo muito elevado. Está sendo estudado um tipo de cálculo para contornar esse problema”.
A idéia que se discute, segundo ele é: se romper uma peça, no conjunto estrutural, o que acontece? “A ideia é que se projete o edifício de maneira que o colapso de uma só peça não fundamental não provoque uma ruptura desmesuradamente grande. O projeto terá de prever o que pode romper ou não. Então essas peças, ou segmentos específicos dentro do conjunto, terão que ser calculadas de maneira mais robusta, com excesso de material , excesso de aço, de dimensionamento, ou seja, pontos deverão ser exagerados no sentido do cálculo estrutural, para evitar a falência global da estrutura. Isso ainda está em cogitação. Mas é certo que na próxima edição da Norma Brasileira sobre concreto irá aparecer um capítulo sobre Robustez, entre outras novidades”, decreta.
Outra novidade? Ele destaca o desenvolvimento do cálculo por incremento. E lembra o caso do edifício Kasumigaseki em Tóquio, no Japão, em que era preciso atingir o 36º andar antes da época dos tufões, caso contrário ele não suportaria a carga dos ventos verticais. Eles estavam com dificuldade enorme de atingir aquela altura antes daquela data, então aceleraram a obra numa época que não era possível acelerar. Mesmo assim, quando estava chegando a época dos tufões, a obra começou a correr risco, e eles precisaram trabalhar dia e noite, até sob temperaturas negativas, para atingir a altura necessária. “Eles utilizaram o sistema de construção incremental. Nesse edifício há caixa de água na cobertura, para equilibrar a força dos ventos durante a época dos tufões. Ou seja, sempre há novidades, alterações, mudanças, que podem dar ganhos novos para a Engenharia como um todo”.
Na opinião do professor, as dificuldades enfrentadas no Brasil para ganhar mais avanço na Engenharia e na Construção são menos de ordem econômica e mais de ordem política. O professor Vasconcelos casou-se duas vezes, com Wanda, já falecida, com quem teve dois filhos Paulo e Cecilia, e Júlia com quem está casado há 30 anos. Ainda hoje tem em sua sala um piano e partituras musicais onde de vez em quando se arrisca a tocar algumas músicas. Dirige seu próprio automóvel, frequenta as rodas da Engenharia, mantém o interesse pelo trabalho e pelos amigos e pela vida.
Criatividade fantástica
Tive meu primeiro contato com o professor Vasconcelos nos idos de 1969, quando comecei a trabalhar na Cinasa, empresa de pré-fabricados de concreto que ele havia auxiliado na fundação e prestava serviços de consultoria. Formado na Escola Politécnica da Universidade de São Paulo em 1948, Dr.-Ing em 1954 na Alemanha, professor da Poli, FEI, FAU e Mackenzie, examinador em bancas de mestrado e doutorado, autor de vários livros (Manual de Concreto Protendido, O Concreto no Brasil – vols. I, II e III, Estruturas Arquitetônicas, Pontes Brasileiras, Estruturas da Natureza, Máquinas da Natureza entre outros) e ainda escrevendo e lançando novos livros, publicou vários artigos técnicos, teve escritório de projetos estruturais e após seu fechamento vem trabalhando como consultor.
Sua criatividade é fantástica. Desenvolveu sistema de protensão de chapas por calor, explica como funciona o sistema de pontes por aduelas sucessivas através de modelo em miniatura com borrachas de apagar lápis com furo no centro e muitas outras criações. Já passou por sérios problemas de saúde mas de cada problema resolvido, parece rejuvenescido e disposto para novos desafios. Prestes a completar 90 anos (26-10-12), creio que todos os que tiveram o privilégio de uma convivência por menor que tenha sido com ele, desejam muita saúde e o prazer de poder ainda comemorar seu centenário.
Eduardo Barros Millen, presidente da Associação Brasileira de Engenharia e Consultoria Estrutural (Abece) e diretor da Zamarion e Millen Consultores.
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