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Revista GC - Ed.96 - Junho 2021
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Especial Saneamento

A próxima fronteira da infraestrutura

Para especialistas, novo marco legal deve levar o saneamento a um maior número de brasileiros, estimulando uma necessária cooperação entre os setores público e privado
Por Melina Fogaça

Prestes a completar um ano, o novo Marco Regulatório do Saneamento Básico (Lei 14.026/2020), sancionado em julho de 2020, traz relevantes inovações, como a obrigatoriedade de metas de desempenho, universalização e regionalização dos serviços de saneamento, além de estimular a livre concorrência entre empresas públicas e privadas.

Adicionalmente, a nova lei ampliou substancialmente a competência da Agência Nacional de Águas (ANA), que passa a regular o saneamento básico como um todo. Com as mudanças, o setor vem se estruturando para atender às metas determinadas pelo novo marco legal, ciente de que isso levará algum tempo para ocorrer, ainda mais no cenário de pandemia.

“Contudo, o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) vem apoiando estados e municípios na estruturação de projetos”, afirma Sueli Oliveira, diretora da área de projetos em saneamento da Allonda. “E muitos municípios já estão preparando os futuros processos concorrenciais de seus serviços de saneamento.”

Sueli Oliveira, da Allonda: municípios se preparam para a concorrência do serviços

Como explica Percy Soares Neto, diretor executivo da Associação Brasileira das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (Abcon), o novo marco regulatório do saneamento ainda precisa ser regulamentado via decreto para ser devidamente efetivo. “É o chamado arcabouço jurídico da lei”, diz ele.

Em março, todavia, foi dado mais um passo importante para a consolidação das diretrizes estabelecidas pelo novo marco – como a abertura para a competição no setor, a regionalização para garantir economia de escala na operação e o fortalecimento da regulação a partir de normas nacionais instituídas pela ANA – com a aprova


Prestes a completar um ano, o novo Marco Regulatório do Saneamento Básico (Lei 14.026/2020), sancionado em julho de 2020, traz relevantes inovações, como a obrigatoriedade de metas de desempenho, universalização e regionalização dos serviços de saneamento, além de estimular a livre concorrência entre empresas públicas e privadas.

Adicionalmente, a nova lei ampliou substancialmente a competência da Agência Nacional de Águas (ANA), que passa a regular o saneamento básico como um todo. Com as mudanças, o setor vem se estruturando para atender às metas determinadas pelo novo marco legal, ciente de que isso levará algum tempo para ocorrer, ainda mais no cenário de pandemia.

“Contudo, o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) vem apoiando estados e municípios na estruturação de projetos”, afirma Sueli Oliveira, diretora da área de projetos em saneamento da Allonda. “E muitos municípios já estão preparando os futuros processos concorrenciais de seus serviços de saneamento.”

Sueli Oliveira, da Allonda: municípios se preparam para a concorrência do serviços

Como explica Percy Soares Neto, diretor executivo da Associação Brasileira das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (Abcon), o novo marco regulatório do saneamento ainda precisa ser regulamentado via decreto para ser devidamente efetivo. “É o chamado arcabouço jurídico da lei”, diz ele.

Em março, todavia, foi dado mais um passo importante para a consolidação das diretrizes estabelecidas pelo novo marco – como a abertura para a competição no setor, a regionalização para garantir economia de escala na operação e o fortalecimento da regulação a partir de normas nacionais instituídas pela ANA – com a aprovação dos vetos do Executivo à lei, em sessão realizada pela Câmara dos Deputados.

“Com a manutenção dos vetos, não será permitida a renovação dos chamados contratos de programa, vigentes entre companhias estaduais e prefeituras por períodos que poderiam chegar a mais 30 anos”, ressalta o especialista.

ACELERAÇÃO

Seguindo a linha de raciocínio, o gerente de desenvolvimento de negócios em serviços de saneamento na Acciona Brasil, Cayetano Gaspar Cases Martinez, considera que esse veto foi um dos principais pontos sancionados na promulgação da lei.

“Com o veto à renovação sem licitação prévia, abrem-se oportunidades de melhoria dos serviços, uma vez que as empresas, tanto municipais quanto estatais, terão que apresentar como irão atender às metas de universalização até 2033”, comenta.

Martinez, da Acciona: marco estimula a isonomia entre o público e o privado

Desse modo, os municípios que não estiverem com contratos de programa vigentes precisarão necessariamente abrir licitações, estimulando assim uma aceleração em projetos que, sem o veto, poderiam ser postergadas por um prazo bem mais longo. De acordo com o SNIS 2019 (Sistema Nacional de Informações em Saneamento), um total de 888 municípios devem licitar ou “remunicipalizar” os serviços nos próximos anos.

De acordo com Rodrigo de Pinho Bertoccelli, especialista em infraestrutura e saneamento do escritório Felsberg Advogados, a manutenção pelo Congresso dos vetos de fato põe fim a uma disputa que se arrasta desde julho do ano passado e represou um fluxo regulatório importante para destravar projetos e investimentos.

“Com a edição dodecreto que regulamenta a lei, já se sabe comoverificar a capacidade econômico-financeira das empresas de saneamento”, explica Bertoccelli. “Agora, as empresas têm de demonstrar como farão os investimentos para cumprir a meta fixada na lei, que é a universalização dos serviços até 2033.”

O decreto, ele afirma, define a metodologia para se aferir a capacidade de investimento dessas empresas. “O decreto abre um horizonte mais claro sobre volume, tempo de investimento e market share no setor de saneamento’, diz o advogado.

Outro ponto relevante relacionado ao marco é a regionalização dos serviços. Segundo Martinez, o governo está estimulando a regionalização por meio da liberação de financiamentos com recursos da União para projetos locais, o que pode tanto ser um benefício, por fomentar a formação de blocos e gerar mais fontes de receita, quanto um entrave, já que exige uma laboriosa articulação política para a formação de blocos entre diferentes municípios.

“Além disso, outro aspecto positivo já em andamento é o fato de que a ANA terá o papel de reguladora federal, com definição de diretrizes de forma a normatizar mais efetivamente o setor”, comenta o executivo da Acciona.

Ademais, a Portaria nº 490, do Ministério do Desenvolvimento Regional, publicada em 22 de março, impossibilita o acesso a financiamentos com recursos da União para municípios que superem os valores estabelecidos como índices máximos de perda.

“Hoje, já vemos, por exemplo, articulações governamentais para fiscalização das empresas de saneamento com perdas elevadas, o que é um grande ganho para todos”, acentua Martinez.

APTIDÃO

O novo marco estabeleceu a data de 31 de dezembro de 2033 como meta-chave. Neste período, projeta a lei, o país deve alcançar os objetivos de universalização do setor, isto é, 99% da população com acesso à água potável e 90% com acesso ao tratamento e à coleta de esgoto.

Segundo Martinez, da Acciona, o investimento total para a universalização do saneamento é de R$ 700 bilhões, mas apenas com uma articulação adequada entre munícipios e a entrada efetiva das empresas privadas no setor é que de fato será possível alcançar a ambiciosa meta proposta.

“São apenas 12 anos para se construir um grande avanço, que começa na estruturação das licitações, o que por si só já não é uma tarefa que ocorre de forma acelerada”, diz ele.

Apesar dos impasses ainda em aberto, Soares Neto, da Abcon, avalia que o mercado de saneamento brasileiro demonstra já estar apto para grandes projetos de concessão e parcerias com a iniciativa privada.

No segundo semestre de 2020, ele cita como exemplo, foram realizados três leilões com forte concorrência entre players públicos e privados, incluindo os certames da região metropolitana de Maceió (Alagoas), da Sanesul (Mato Grosso do Sul) e de Cariacica (Espírito Santo). “

Soares Neto, da Abcon: arcabouço jurídico da nova lei ainda está em fase de consolidação

Além disso, o leilão da Cedae (Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro) deve injetar R$ 47 bilhões na economia e criar 402 mil empregos diretos e indiretos”, afirma o dirigente, citando dados da própria Abcon e da Abdib (Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base).

Maior projeto de infraestrutura do país na atualidade, o leilão da Cedae foi realizado na Bolsa de Valores de São Paulo (B3) no dia 30 de abril, arrecadando R$ 22,6 bilhões com a venda de três dos quatro blocos ofertados.

Apesar desse sucesso inicial, o executivo da Abcon acredita que atingir os objetivos estabelecidos pelo marco seja uma tarefa realmente desafiadora, principalmente quando se leva em consideração os frágeis números do setor até aqui.

“Há cerca de 35 milhões de pessoas ainda sem acesso à água potável de qualidade e mais de 100 milhões de brasileiros sem esgotamento sanitário”, recorda Soares Neto.

A premissa é compactuada por Sueli Oliveira, da Allonda. De acordo com a executiva, muitos municípios são deficientes no atendimento das demandas, principalmente na coleta e tratamento de esgoto.

“Somente uma coordenação de esforços entre iniciativa pública e privada pode resgatar, até 2033, a dívida que temos com milhões de brasileiros sem acesso ao saneamento básico adequado”, pontua.

APETITE

Para atingir os objetivos, Soares Neto afirma ser preciso garantir segurança jurídica, ter bons projetos e estimular a regulação. Segundo ele, é necessário que os contratos ainda vigentes (precedidos de licitação) sejam respeitados, assim como a modelagem dos blocos de municípios seja bem-feita e tecnicamente embasada, a fim de sustentar a economia de escala, ou seja, a viabilidade financeira desses blocos.

O especialista cita ainda a qualidade dos contratos futuros, que precisam apresentar uma matriz de riscos devidamente detalhada, de modo a criar os incentivos adequados para que tanto operadores quanto o poder concedente cumpram seu papel da melhor forma possível.

“E, finalmente, precisamos de uma regulação de qualidade, com o fortalecimento da ANA e das normas de referência, de modo a viabilizar o aumento da eficiência do setor e garantir a universalização”, aponta.

Para Bertoccelli, da Felsberg Advogados, um mercado como o Brasil, em que metade da população ainda não tem esgoto tratado, oferece escala e oportunidades que países desenvolvidos já não têm. “O setor de saneamento representa um investimento com baixo risco de engenharia, sendo resiliente à inadimplência em crises”, afirma.

Bertoccelli, do escritório Felsberg: regionalização é benéfica para o setor

O apetite do capital privado por ativos dessa natureza é grande, diz ele, até pelo interesse global crescente por investimentos em ESG (Environmental, Social and Governance), que levam em conta critérios de sustentabilidade, em conexão direta com o saneamento básico. “

Se acertarmos o caminho regulatório, com racionalidade jurídica e previsibilidade, modelarmos bons projetos, a exemplo do que tem sido feito pelo BNDES, e aperfeiçoarmos a governança pública e as parcerias, transmitindo mais segurança para o investidor, penso que conseguiremos cumprir os objetivos estabelecidos no marco”, projeta.

Com o novo marco regulatório, diz o advogado, o saneamento (que sempre foi o primo pobre da infraestrutura) passa a ganhar protagonismo. “O setor de saneamento é a próxima fronteira da infraestrutura”, ele crava. “E ainda que de forma gradual, já é possível perceber uma movimentação maior no ecossistema.”

Empresas como a Acciona já perceberam isso. Com o novo marco legal, a empresa de origem espanhola enxerga um enorme potencial no setor, tendo já executado projetos importantes como o Sistema de Esgotamento Sanitário de Santa Cruz do Capibaribe (PE), esquematizado para tratar uma vazão de 360 litros por segundo e beneficiar 196.000 pessoas até 2037, conforme o crescimento populacional local.

“Além de atuação em projetos de tratamento de água e esgoto, a companhia também está aberta a oportunidades em dessalinização e prestação de serviços aos munícipios usando tecnologias avançadas”, assegura Martinez.

TECNOLOGIA

Por falar em tecnologias, o executivo afirma que, a partir da atuação em diversos países, a Acciona constatou na prática como o investimento em inteligência artificial e ciência de dados pode trazer ganhos relevantes na redução de custos e otimização do tempo no setor, além de contribuir para a redução de impactos ambientais.

Prazo para universalização é exequível, mas estruturação das licitações leva tempo

Segundo Martinez, atualmente os centros de Pesquisa & Inovação da empresa desenvolvem tecnologias de membrana, soluções de dessalinização da água do mar, técnicas de eliminação de poluentes em águas complexas, tratamento biológico de águas residuais e lodo, inteligência artificial e aprendizado da máquina para detecção precoce de vazamentos, dentre outras.

“A empresa faz uso de simuladores que replicam o sistema real que será implantado nas plantas de tratamento da água, permitindo testar o sistema de controle e as sequências de processo, mais conhecidos como 'Gêmeo Digital’, comenta o especialista, explicando que o conceito consiste em um modelo preciso e continuamente atualizado das plantas.

“A partir da representação digital do sistema, é possível antever problemas e realizar atividades de treinamento em plataformas, de acordo com a demanda local e a utilização dos dados em tempo real”, acrescenta.

Estratégia de investimentos no setor deve atender a requisitos técnicos, ambientais, sociais e econômicos

Na Allonda, como explica a diretora Sueli Oliveira, o foco em soluções sustentáveis inclui o uso da tecnologia para prover transparência às informações e viabilizar sistemas automatizados, fonte mais limpas de energia e novos processos de tratamento de água, esgoto e lodo, dentre outros aspectos.

“Toda a estratégia de investimentos no setor de saneamento, que certamente serão impulsionados nos próximos anos, deve atender a requisitos técnicos, ambientais, sociais e econômicos”, ela observa. “Isso permite trabalhar o conceito de desenvolvimento sustentável e de preservação e conservação do meio ambiente, particularmente dos recursos hídricos, o que se reflete diretamente no planejamento das ações de saneamento.”

Segundo Sergio Jacobsen, CEO da área de infraestrutura inteligente da Siemens, a digitalização dos sistemas de água e esgoto faz com que seja possível explorar de forma otimizada todo o potencial dos sistemas, possibilitando ganhos durante o ciclo de vida das instalações.

“A integração gera benefícios não apenas na execução, mas também na operação e manutenção de todo o sistema de água e esgoto”, explica.

“Por meio do conceito de engenharia e operações integradas, é possível obter redução de até 20% em tempo de projeto e de até 15% no comissionamento, além de redução de até 10% nos custos de manutenção.”

Jacobsen, da Siemens: digitalização otimiza potencial dos sistemas de saneamento básico

O uso de tecnologias de digitalização, ele prossegue, também facilita a gestão do sistema, possibilitando uma utilização mais sustentável dos recursos hídricos ao reduzir o consumo energético e as perdas de água, por exemplo.

“A digitalização do sistema permite ainda a realização de ações preditivas e gera insights para uma gestão mais inteligente de todos os ativos”, comenta Jacobsen.

Um bom exemplo do uso de tecnologia é o projeto Aguaduna, aponta o executivo, a primeira cidade inteligente do Brasil, que será construída na região de Entre Rios, no litoral norte da Bahia. “Esse projeto pretende ser um modelo na relação entre cidade e meio ambiente”, afirma.

Primeira cidade inteligente do Brasil pretende ser um modelo na relação com o meio ambiente

Concebido na Espanha e no Brasil, o projeto iniciaria as obras ainda no segundo trimestre deste ano. Segundo o executivo, o escopo prevê uma infraestrutura de abastecimento que abrange reúso, captação de água da chuva, utilização de água para agricultura e redução de superfícies impermeáveis.

“O projeto da cidade inteligente prevê apenas 14% de superfícies construídas e 86% de área permeável”, conta Jacobsen. “Com essas iniciativas, estima-se uma redução de 50% na demanda de água potável para a cidade.”

ESTUDO REAFIRMA DESAFIOS PARA A UNIVERSALIZAÇÃO

Publicada pela Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (ABES), a edição 2021 do “Ranking da Universalização do Saneamento” reafirma os grandes desafios para a universalização no país e a importância do saneamento para a saúde.

Em sua 5ª edição, o ranking reúne informações de 1.670 municípios brasileiros, o que representa cerca de 70% da população do país. O estudo mostra que a maior parte das capitais brasileiras está na categoria ‘empenho’ (48,15%), sendo que a única capital na categoria rumo à universalização é Curitiba (PR). A menor pontuação foi registrada em Porto Velho (RO).

Assim como nas edições anteriores, a correlação ficou evidente: quanto maior o acesso ao saneamento, menor a incidência de internações por Doenças Relacionadas ao Saneamento Ambiental Inadequado. “

As disparidades do saneamento no Brasil exigem do setor, frente ao novo Marco Legal e num momento tão desafiador, que o critério para as mudanças deva ser o atendimento à população”, ressalta o presidente da ABES, Alceu Guérios Bittencourt.

“Considerando que a prioridade na discussão deva ser a manutenção dos serviços existentes e a mais rápida ampliação do atendimento nas áreas não servidas, a ABES propõe a discussão imediata desse necessário processo de transição, incluindo as diversas peculiaridades e condições objetivas trazidas pela nova legislação para situações de contratos vigentes e de municípios sem contrato.”

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