Revista M&T
10/11/2022 15h59 | Atualizada em 19/01/2023 10h13
Em todo o mundo, há uma busca constante por soluções para a construção de túneis, reconhecidamente uma das mais complexas áreas da engenharia, por conta dos desafios e imprevistos enfrentados ao longo de todas as etapas de execução, desde o projeto até a entrega.
Nesse cenário, o papel da sondagem geológico-geotécnica – o princípio de tudo nesse segmento – é um fator decisivo no desempenho de obras de passagem para meios de transporte, exploração mineral e serviços como saneamento. É também da investigação ge
...Em todo o mundo, há uma busca constante por soluções para a construção de túneis, reconhecidamente uma das mais complexas áreas da engenharia, por conta dos desafios e imprevistos enfrentados ao longo de todas as etapas de execução, desde o projeto até a entrega.
Nesse cenário, o papel da sondagem geológico-geotécnica – o princípio de tudo nesse segmento – é um fator decisivo no desempenho de obras de passagem para meios de transporte, exploração mineral e serviços como saneamento. É também da investigação geológica que surgem as principais inovações.
Com mais de 30 anos de experiência em sondagens e fundações de construção pesada, o engenheiro civil e geotécnico Luiz Antonio Naresi Jr., gerente técnico da Progeo Engenharia, destaca que, apesar da importância, “ainda é necessário explicar exaustivamente a importância do planejamento na construção de túneis”.
Naresi, da Progeo: planejamento é crucial na construção de túneis
E o especialista não é o único com tal percepção. “Antes de discutir como vai ser a sondagem, é importante que o dono da obra entenda que se trata de uma etapa indispensável, que reduz riscos e imprevistos”, acrescenta Eloi Angelo Palma Filho, presidente do Comitê Brasileiro de Túneis (CBT). “Estudos apontam que, quanto menos se investe na investigação, mas se gasta com aditivos em obras desse tipo.”
Segundo Naresi, as sondagens para execução de túneis devem ser executadas em número suficiente para detectar as diversas alterações de camadas ao longo da escavação.
“Com o tempo, os equipamentos de sondagem têm ficado cada vez mais robustos, versáteis, ágeis e rápidos, a ponto de minimizar a exposição do trabalhador ao risco, com sistemas autopropelidos e até remotos para prospecção a distância”, destaca o especialista, que também é coordenador de pós-graduação em engenharia geotécnica na RTG Especialização.
Câmeras de alta definição penetram no interior da perfuração
Um bom exemplo disso são as câmeras de alta-definição, diz ele, que penetram no interior da perfuração para sondagem, filmando os furos nas paredes em 360 graus. “A filmagem consegue enxergar furos já executados no maciço e depois recriar digitalmente o corpo de prova retirado”, acrescenta Palma. “Mas essa tecnologia é complementar aos métodos tradicionais de investigação.”
METODOLOGIAS
Atualmente, os métodos mais aplicados na construção de túneis no Brasil incluem conceitos como VCA (Vala de Céu Aberto), NATM (New Austrian Tunneling Method), TBM (Tunnel Boring Machine) e Tunnel Liner.
O método VCA tem enfrentado cada vez mais restrições em centros urbanos, devido não apenas às interferências geotécnicas, mas também às que ocorrem na superfície do local de execução.
“Quando se estuda um túnel em VCA, é importante analisar o impacto que isso causa à sociedade”, adverte o presidente do CBT. “Em geral, o impacto é grande, causando transtornos como fechamento de ruas – e isso não pode deixar de ser considerado, apesar de ser uma solução possível.”
Ao contrário, o NATM se difundiu muito no Brasil em anos recentes. Segundo Palma, o conceito reúne uma série de técnicas em permanente evolução. É o caso do concreto projetado, executado em camadas sucessivas e que normalmente recebe o reforço de fibras de aço, tornando-se um elemento importante nas seções do túnel executadas pelo método.
Como exemplo, o especialista cita a adição de uma camada de sacrifício – além da camada estrutural – na aplicação do concreto projetado, composta por fibras resistentes ao fogo, uma preocupação recorrente durante a obra e, principalmente, na operação do túnel. “Há ainda uma solução com o uso de termômetro, que logo após a aplicação consegue prever o comportamento de longo prazo do concreto projetado”, conta.
Também já é realidade o uso de drones para levantamentos geotécnicos dentro do túnel, assim como de equipamentos a laser para medições, que tiram as pessoas de frente de escavação, que constitui a área de maior risco na execução de túneis pelo método NATM.
Palma, do CBT: técnicas exigem análise dos impactos
Dependendo do maciço, pode-se aplicar ainda uma coluna de jet grouting – uma solução capaz de impermeabilizar a seção, transformando o solo em material resistente. A adoção dessa técnica tem avançado bastante em obras de túneis. “A injeção de calda de cimento no solo pode ser feita a partir da superfície ou do próprio interior do túnel, em colunas horizontais e verticais”, explica Palma.
Nesse ponto, Naresi ressalta que “a solução de jet grouting visa amenizar seções superiores do eixo do túnel em solos instáveis, podendo ser dimensionada de acordo com o resultado da sondagem e da modelagem do estudo de tensões do túnel em construção, com a função de estabilizar o solo durante a escavação”.
Por sua vez, o TBM (popularmente conhecido como “tatuzão”) preconiza o uso de uma megamáquina na escavação de solo. Segundo Naresi, atualmente a tuneladora é considerada a mais eficiente tecnologia para a construção de túneis, pois além de escavar, é capaz de instalar anéis de concreto pré-moldados ou de metal durante sua passagem, adequando o maciço escavado para a instalação dos acessórios a que se destina.
“No Brasil, há uma clara tendência de se usar mais o TBM, que traz benefícios como um cronograma ajustado e uma obra mais limpa”, aponta. “Além disso, a produção também é maior [que nos demais métodos].”
Tuneladora é considerada a mais eficiente tecnologia para a construção de túneis
O especialista do CBT acentua que essas máquinas controlam a escavação do túnel com uma precisão cada vez maior, uma vez que são altamente automatizadas e capazes de detectar várias situações de risco ao longo da operação.
Já o método Tunnel Liner é considerado um método rápido, versátil e seguro, porém limitado a diâmetros de até 6 m. Na medida em que a escavação avança, chapas metálicas são inseridas nos segmentos. “Trata-se de uma técnica antiga. Hoje, esses túneis com menor diâmetro já são feitos de forma mecanizada por minituneladoras”, destaca Palma. “Em áreas urbanas, a tendência é trabalhar de forma mecanizada, pois se consegue uma produção maior.”
Com essas mudanças, o engenheiro Naresi acrescenta que o Tunnel Liner tem sido aplicado mais em obras de drenagem urbana, “tendo em vista que alcançam grandes profundidades e distâncias, sem afetar a superfície em regiões altamente adensadas”.
Acrescentando mais um método, o presidente do CBT diz que a técnica italiana ADECO-RS (Análise das Deformações Controladas em Rochas e Solos, ainda não utilizada no Brasil) permite que a escavação seja estabilizada ao agir a montante na frente de trabalho – ao contrário do NATM, no qual a estabilização é feita a jusante. “Há um potencial de uso desse método no país, mas a questão é que demanda uma perfuratriz de 24 m que ainda não existe por aqui”, ele observa.
ESTABILIZAÇÃO
O engenheiro Naresi ressalta que também há técnicas atualizadas de estabilização nas execuções de emboques, que merecem cuidados especiais nas obras de túneis, pois se encontram em uma zona de transição entre camadas distintas (moles e duras) de solo.
“Pode-se fazer tratamentos de estabilidade mais eficientes para o disparo (de escavação) a partir dos emboques, envolvendo tirantes protendidos, cortinas atirantadas, tratamentos com solo grampeado, seguidos de aplicação de tela metálica de alta resistência e adoção de concreto projetado no paramento frontal”, ele detalha.
“Também se utilizam tratamentos passivos executados por enfilagem tubular metálica, com tubos de aço de alta resistência dotados de válvula manchete, podendo ser injetada calda de cimento para tratamento e preenchimento do maciço, protegendo o emboque superior da escavação e garantindo uma laje frontal de proteção mais resistente.”
Técnicas atualizadas de estabilização estão entre os avanços do segmento
No emboque, Palma concorda que a enfilagem continua sendo uma boa solução. “No primeiro avanço, pode-se aplicar até duas linhas de enfilagens para deixar o emboque mais rígido”, afirma. Segundo Naresi, há ainda outra solução eficaz, que é o tratamento do núcleo frontal da escavação com tirantes de fibra de vidro, visando garantir maior rigidez.
O executivo do CBT aquiesce que o tirante de fibra de vidro tem boa tração e, por outro lado, apresenta fácil corte. “Quando se utiliza escavadeira, torna-se mais fácil cortar trechos de tirantes de fibra de vidro do que o tradicional vergalhão, acelerando o processo”, destaca.
De acordo com Naresi, a injeção de calda de cimento – feita com a inserção de tubos de PVC manchetados [com pontos de ancoragem], abaixo da superfície inferior do túnel – também funciona como um eficiente tratamento de solo. “A força por pressão provoca a entrada da calda de cimento nos espaços vazios do solo, removendo inclusive as partículas de água, o que protege a escavação do lençol freático e garante melhor rigidez”, descreve.
OBRA
Túneis superam desafios em trecho misto
Uma das principais obras de infraestrutura em execução no país, o Contorno Rodoviário de Florianópolis (SC) conta com quatro túneis ao longo de 50 km de extensão. A execução de três deles está a cargo do Consórcio Túneis Litoral Sul, composto pelas empresas Aterpa e JDantas, ambas do Grupo Aterpa.
Em encontro recente do Comitê Brasileiro de Túneis (CBT), o engenheiro Thiago de Sá Lima, gerente de contrato do consórcio, detalhou a execução das passagens subterrâneas para a Arteris, contratante da obra. Segundo ele, o desenvolvimento dos túneis 1 (de 1.190 m, contabilizando a construção em ambos os sentidos) e 4 (de 1.465 m, somando os dois sentidos) começou no ano passado e já está em fase de conclusão. Já as obras do túnel 2 começaram este ano.
“O maior desafio da escavação em método NATM ocorreu no chamado trecho misto (com solo e rocha), bem mais frequente no túnel 1, tanto que o túnel 4 teve avanço mais rápido”, explicou Lima, destacando que a escavação exigiu pregagens com tirantes de fibra de vidro, que são mais resistentes.
A maior dificuldade de furação nas seções mistas para a execução do pré-suporte (etapa em que rocha e solo são perfurados na mesma seção) é a presença de água ou material desagregado. Nesse caso, o consórcio optou por uma tecnologia mais avançada: a enfilagem autoperfurante (ao invés do sistema de enfilagem tubular convencional). Utilizando jumbo em trechos de três metros, obteve-se ganho de produtividade em partes com baixa cobertura de rocha.
Obras do Contorno Rodoviário de Florianópolis incluem a construção de quatro túneis
Segundo o presidente do CBT, Eloi Angelo Palma Filho, na última década houve avanço na técnica, que aumenta a estabilidade do maciço e uniformiza a perfuração. “A enfilagem tradicional faz o furo e, depois, é inserido o tubo de enfilagem”, explica. “Já a enfilagem autoperfurante vai junto com o furo da perfuratriz, com ganhos no tempo de produção.”
A escavação mecanizada com escavadeira e rompedores na seção mista do túnel, feita em seguida à instalação de cambotas metálicas, foi padrão na obra. Já a maior parte da aplicação de concreto projetado foi feita com robôs.
"Nesse caso, o operador controla o equipamento com joystick a alguns metros de distância, assegurando maior qualidade, segurança e produtividade ao processo", explica.
Saiba mais:
CBT: www.tuneis.org.br
Grupo Aterpa: www.grupoaterpa.com.br
Naresi: www.naresi.com
Progeo Engenharia: www.progeo.com.br
RTG: https://rtgespecializacao.com.br
25 de novembro 2024
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