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Revista GC - Ed.55 - Dezembro 2014
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Mesa Redonda

Normas regulamentadoras: mais incertezas que respostas

Representantes de diversos segmentos da cadeia da construção compartilham dúvidas, perplexidades e insatisfações diante das tentativas malsucedidas de se disciplinar questões de segurança e saúde no trabalho

Discutir as normas regulamentadoras (NR’s) que disciplinam as atividades de trabalho nos setores da construção e mineração, com foco nas questões de segurança e saúde, e seus impactos sobre estas atividades econômicas. Esse foi o objetivo da segunda mesa-redonda, promovida pela revista Grandes Construções, em parceria com o instituto Opus, no dia 6 de novembro, na sede da Sobratema, em São Paulo.

As discussões, que envolveram representantes de importantes segmentos da cadeia da construção, foram pautadas pelos problemas gerados pelas inúmeras regras, muitas delas conflitantes entre si, contidas nas diversas NR’s. Além da falta de clareza dessas regras, foram destacadas como complicador deste processo as constantes edições de decretos alterando os textos originais, antes mesmo que o mercado tenha tempo de assimilar as primeiras mudanças.

Participaram da mesa-redonda Decio Branco de Mello Filho, Engenheiro de Segurança da Odebrecht Infraestrutura; Haruo Ishikawa, vice-presidente de Relações Capital-Trabalho do SindusCon-SP; Cosmo Palasio, técnico de segurança do trabalho e membro da Associação Brasileira dos Profissionais de Segurança e Saúde no Trabalho e do Meio Ambiente (Abraphiset), e Wilson de Mello Júnior, diretor de Certificação e Desenvolvimento Humano da Sobratema. Todos concordaram com a fata de conhecimento do dia-a-dia dos canteiros de obras e da realidade cultural dos trabalhadores do setor, por parte de quem elabora as normas. Isso faz com que sejam produzidos normas que não são exequíveis e que geram prejuízos para as empresas e insegurança para a classe trabalhadora.

Os integrantes da mesa-redonda também foram unânimes na identificação da Educação como fator de transformação nas relações de trabalho no Brasil e sua importância para a definição de um novo projeto de Nação.

Ficou acertado que o tema das NR’s, merecerá atenção especial nos próximos encontros, com o objetivo de aprofundar a discussão e levar esclarecimento para as cadeias da Construção e Mineração e para a sociedade como um todo.

Com esse mesmo objetivo, a Sobratema anunciou, durante o evento, a iniciativa de criar, dentro do seu núcleo de j


Discutir as normas regulamentadoras (NR’s) que disciplinam as atividades de trabalho nos setores da construção e mineração, com foco nas questões de segurança e saúde, e seus impactos sobre estas atividades econômicas. Esse foi o objetivo da segunda mesa-redonda, promovida pela revista Grandes Construções, em parceria com o instituto Opus, no dia 6 de novembro, na sede da Sobratema, em São Paulo.

As discussões, que envolveram representantes de importantes segmentos da cadeia da construção, foram pautadas pelos problemas gerados pelas inúmeras regras, muitas delas conflitantes entre si, contidas nas diversas NR’s. Além da falta de clareza dessas regras, foram destacadas como complicador deste processo as constantes edições de decretos alterando os textos originais, antes mesmo que o mercado tenha tempo de assimilar as primeiras mudanças.

Participaram da mesa-redonda Decio Branco de Mello Filho, Engenheiro de Segurança da Odebrecht Infraestrutura; Haruo Ishikawa, vice-presidente de Relações Capital-Trabalho do SindusCon-SP; Cosmo Palasio, técnico de segurança do trabalho e membro da Associação Brasileira dos Profissionais de Segurança e Saúde no Trabalho e do Meio Ambiente (Abraphiset), e Wilson de Mello Júnior, diretor de Certificação e Desenvolvimento Humano da Sobratema. Todos concordaram com a fata de conhecimento do dia-a-dia dos canteiros de obras e da realidade cultural dos trabalhadores do setor, por parte de quem elabora as normas. Isso faz com que sejam produzidos normas que não são exequíveis e que geram prejuízos para as empresas e insegurança para a classe trabalhadora.

Os integrantes da mesa-redonda também foram unânimes na identificação da Educação como fator de transformação nas relações de trabalho no Brasil e sua importância para a definição de um novo projeto de Nação.

Ficou acertado que o tema das NR’s, merecerá atenção especial nos próximos encontros, com o objetivo de aprofundar a discussão e levar esclarecimento para as cadeias da Construção e Mineração e para a sociedade como um todo.

Com esse mesmo objetivo, a Sobratema anunciou, durante o evento, a iniciativa de criar, dentro do seu núcleo de jovens executivos e empresários, um grupo de trabalho dedicado à discussão das NR’s e seus impactos sobre o setor produtivo.

Participam do grupo de trabalho Raljo Borges Naylor, Claudio José Castro Silva e Rainer Rostirolla, representantes da construtora Queiroz Galvão; Daniel Rocha, da Liebherr; Cláudio Morais, da Makro Engenharia; Bernardo Uliana, da Tracbel; Lupercio de Almeida Filho, da IV Guindastes; Daniel W. Zacher, da John Deere; Gustavo da Fonseca, da Manitowoc; e Decio Branco de Mello Filho, da Odebrecht Infraestrutura. O grupo de trabalho será coordenado por Wilson de Mello Jr, diretor de Certificação de Desenvolvimento Humano da Sobratema.

Formado este ano, o núcleo de jovens executivos e empresários reúne profissionais de construtoras, mineradoras, fabricantes de equipamentos, locadores e distribuidores de equipamentos. De importância estratégica, seu principal objetivo é o desenvolvimento de lideranças, de maneira a contribuir com o desenvolvimento das atividades dos setores da construção e da mineração. O núcleo é Coordenado por Rodrigo Konda, gerente de Aquisição de Equipamentos da Odecrecht Infraestrutura.

LONGE DO MERCADO

Wilson de Mello Júnior

Um dos motivos que nos levou a organizar esta mesa redonda para discutir as NR’s foi a percepção que eu tive, ao longo das nossas participações nos grupos de trabalho – mais precisamente para discutir a revisão da NR 18 – da falta de pessoas com conhecimento técnico e vivência de obra, nas discussões. Eu destaco aí a participação do Antônio Pereira, fiscal do Ministério do Trabalho, que é um dos coordenadores das discussões e que tem uma visão muito clara dos problemas. E sempre verifiquei, também, a falta de uma participação mais ativa, por parte das empresas, de pessoas que realmente conheçam o dia-a-dia do setor da construção.

Quando se redige uma norma reguladora, três coisas deveriam ser pensadas: “Isso é viável para ser aplicado na prática?”; “Essas medidas deverão onerar as empresas?” e “Que prazo as empresas precisam para se adaptar a essas mudanças?”. Essas mudanças tinham que ser feitas, mas deveria ter sido analisado um contexto maior. Por falta desta análise estamos indo por um caminho muito perigoso: tendemos muito mais a documentar acidentes do que a preveni-los. Existe hoje uma estrutura burocrática muito grande. Em vejo as pessoas se distanciando das frentes de serviços e se fechando nos escritórios, produzindo papel em vez de encontrar metodologias adequadas de trabalho. E isso está afetando a nossa produtividade.  Nosso objetivo, ao promover esse debate, e provocar o mercado para conseguirmos entender o que está acontecendo. E como provocação eu faço aos integrantes desta mesa a seguinte pergunta: o que aconteceu com a NR-12? Foi travada uma discussão inicial há quatro anos, foi dado este prazo de quatro anos para as empresas se adaptarem e, só no dia que começou a norma começou a ser aplicada é que as pessoas começaram a questioná-la. Aí perguntam: de onde surgiu isso?  Ela foi aprovada por um grupo de estudo, foi divulgada, foi concedido um prazo para a consulta pública. E por que o espanto das empresas somente agora, na hora da aplicação?

Cosmo Palasio

O grande problema é que no Brasil se gasta muito dinheiro para fazer as normas, mas não se investe nada para preparar os interlocutores para elaborar as normas. Na maioria das vezes, quem vai implantar essas normas nas empresas são os engenheiros ou técnicos em Segurança, e nenhuma delas prevê qualquer tipo de treinamento. Então, as empresas vão adotando as normas por tentativa e erro. Falta profissionalização. As últimas três normas significativas que foram editadas no Brasil, a NR-33, NR-35 e NR-12, foram desse jeito.

A NR-33, por exemplo, é uma norma supercomplexa, que trata de trabalho em espaço confinado. Aí você pega um técnico formado há 25 anos, numa época em que nem existia esse conceito no Brasil, e tenta fazer com que ele implante essa norma. Esse técnico vai fazer um monte de coisa que ele nem entende. Com isso, a empresa paga e não leva, pois não se cumpre a norma como deveria. Isto cria uma falsa sensação de segurança. Com a NR-12, o que vimos foi muita gente envolvida e muito dinheiro gasto, no processo de discussão. E ela vai ser revertida. E por que chegamos a esse ponto? Primeiramente porque o comitê tinhas muito mais representantes dos fabricantes do que de outros segmentos. E os fabricantes impuseram até o modelo do que se tem que fazer. Em segundo lugar, porque as interlocuções são jurídicas mas não são técnicas. Quem estava lá na mesa estava mais preocupado em saber qual seria o impacto jurídico das medidas, do que da realidade técnica da sua aplicação. Eu fazia parte do comitê de discussão da NR-1 e abandonei o comitê pelo mesmo motivo.

Esses interlocutores são mandados para esses comitês porque o patronal não compreende a importância dessas discussões.

Em terceiro lugar porque os sindicatos não têm interlocutores técnicos preparadas para estas discussões. São, em sua maioria, diretores sindicais de base, que pensam a segurança de uma maneira antiga. E o Ministério do Trabalho fica lá toureando esse processo. E quando é do interesse dele, ele impõe algumas decisões. Quando não é, ele aceita. Então, esse cenário sempre vai resultar em normas distantes da realidade. É preciso que tenhamos mais cuidados na preparação dos interlocutores para a elaboração e depois para a implantação das normas.

Decio Branco de Mello Filho

Nós compartilhamos desta preocupação. Observamos é que muitas vezes quem vai escrever esses textos não tem o conhecimento do dia-a-dia de uma obra, nunca esteve num canteiro de obras. Nós entendemos que as pessoas que elaboram essas normas devem ter uma formação teórica, mas essas experiências práticas têm que ser agregadas a esse conhecimento acadêmico, para que saiam normas aplicáveis, viáveis e exequíveis. Caso contrário, como o profissional de segurança vai aplicar esta norma dentro da empresa? Esse profissional vai interpretar o texto de um jeito, vai conversar com outras pessoas e aplicar as normas. Mas o que estará sendo aplicado é fruto, muitas vezes do trabalho de um técnico que não tem a preparação adequada.

Cosmo Palasio

É necessário que levemos em consideração o contexto dessas aplicações. Porque muitos desses profissionais vão para fora do Brasil e veem como são aplicadas as normas na Europa, por exemplo. Nós adoraríamos ter normas no padrão das alemãs, mas há um contexto educacional, de garantias sociais diferentes dos nossos. É preciso haver um equilíbrio. É preciso também que sejam consideradas as prioridades. Um exemplo disso é a NR-18. Ela é ótima, mas o que mata realmente, no Brasil? Não podemos mais, em pleno ano de 2014, caminhando para 2015, termos centenas de mortes por falta de escoramento de valas, nas obras, ou por queda.

Você faz uma norma, mas não avança, na prática, porque você finge que faz o exame médico, finge que faz análise preliminar de Riscos (APR), finge que constrói andaime... as normas deveriam ter um critério de implantação mais voltado para a realidade.

CONTRIBUIÇÕES IGNORADAS

Grandes Construções

Mas houve um período em que os textos das normas estiveram abertos à consulta pública, podendo receber sugestões da sociedade. Porque as empresas e os técnicos, que hoje estão atentos às propostas da NR-12, não se pronunciaram durante este período de consulta pública? Porque correr atrás do prejuízo agora, depois que norma entra em vigor e as multas pelo não cumprimento começam a ser aplicadas?

Cosmo Palasio

A primeira causa é a imaturidade da categoria profissional da área de Segurança no Trabalho no Brasil. Infelizmente não temos essa visão do especialista do chão de fábrica subir. O técnico do setor acredita que não tem que se meter com política. A segunda causa é que as sugestões, na verdade, não são levadas em consideração.

Decio Branco de Mello Filho

Nós fizemos várias sugestões. Nenhuma foi acatada.

Wilson de Mello Júnior

Um dos complicadores desse processo de discussão é que os Comitês Permanentes Regionais (CPRs) são mais democráticos, mais abertos à participação. Mas com Comitê Permanente Nacional (CPN) a coisa muda de figura.  Por isso, uma das formas de mudar isso é começar a usar os meios de comunicação, levantar a discussão em nível nacional para que as normas, realmente retratem a realidade do País como um todo. Outro complicador é que assim que a norma é emitida, antes mesmo de entrar em vigor, são publicados vários decretos alterando o texto original. É portaria em cima de portaria. Para mim, o que está claro, nesse contexto todo é que, do jeito que este processo está sendo tocado, malfeito desse jeito, vai continuar morrendo muita gente nos canteiros de obras pelo Brasil afora. E as empresas também estão sendo oneradas, por isso.

LONGE DA SOCIEDADE

Haruo Ishikawa

Ocorre, também, que o setor da construção civil tem uma visibilidade maior que muitos outros. Numa indústria fechada, o acidente de trabalho não alcança tanta visibilidade quanto num canteiro de obras. Lá, qualquer acidente repercute muito mais. No mesmo instante. Uma grande falha que cometemos é que as nossas mídias internas, do setor da construção, não divulgam como deveriam questão do nível de importância das NR’s.

Wilson de Mello Júnior

Eu concordo, mas acho que temos que levantar os assuntos para discuti-los num universo maior. Porque enquanto a discussão estiver fechada, ninguém se interessa. Vejam, por exemplo, as reuniões da CPR: quantas pessoas comparecem? Metade falta. As pessoas não participam.

Haruo Ishikawa

É preciso, também, que haja renovação dos participantes.

Cosmo Palasio

Infelizmente, boa parte dos fóruns organizados hoje, para discutir segurança do trabalho, é comercial. Você vai participar de um desses fóruns, para tentar apreender alguma coisa, e ganha um cartão. É assim num monte de lugares. E para reverter essa situação, é importante criar novos espaços de discussão. Outra coisa é que nós precisamos fazer um planejamento de segurança que seja assimilável. A maioria dos empresários paga e não leva. As empresas pagam caro e não conseguem executar. A maioria dos empresários acredita que pratica segurança nas suas empresas, e as faturas que elas pagam ao final do mês atestam isso. Só que as coisas não acontecem. O trabalho em altura é um exemplo disso. Tem muita coisa para ser mexida de maneira coordenada.

Decio Branco de Mello Filho

Tem muita ferramenta para se aplicar, mas o “feijão com arroz” não é feito.  E os acidentes vêm acontecendo da mesma forma. Queda de altura, choque elétrico, falta de aterramento continuam sendo os grandes vilões dos acidentes na construção.

Cosmo Palasio

E as empresas de consultoria estão sempre enfiando alguma coisa nova, mas que não resolve no final.

Decio Branco de Mello Filho

Exemplo disso é a NR-1, que vem com outra proposta de plano de gestão, ao passo que o Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA) atende perfeitamente 70% do que está na norma.

Wilson de Mello Júnior

O que me chama a atenção e até me choca é quando você precisa de um manual de interpretação para entender uma norma. É o caso da NR-18. Não é mais fácil redigir uma norma que seja compreensível, em vez de elaborar um manual para entendê-la depois?

Haruo Ishikawa

Mas sabe qual é o intuito do manual? É de fazer com que a norma fique inchada. Hoje nós não conseguimos identificar o que é capacitação, qualificação e proficiência.

Há seis meses eu fiz uma obra com estaca hélice contínua. Aí eu perguntei ao operador quantos anos tinha aquela máquina. Ele respondeu que tinha 10 anos.  E estava novinho. Parecia que tinha saído ontem da fábrica. E sabe por que esta máquina está tão bem cuidada? Porque ela custa US$ 2 milhões. Agora, como se pode imaginar a possibilidade de jogar fora uma máquina dessas, porque ela está fora das normas de segurança? Não existe essa possibilidade. E os autores das normas vêm falando em dar 5 anos de prazo para o mercado se adaptar. Pois daqui a 30 anos aquela máquina ainda estará nova. Ela é cuidada como se fosse um bebê. E não é numa canetada que vai se trocar toda a frota nacional com essas características.

Como eu não entendo de máquinas, numa dessas reuniões do CPN eu contratei 12 engenheiros de segurança, de grandes empresas, para opinar sobre a parte técnica.  Porque os caras que estão lá não são técnicos. Eles “palpitam”. Por isso você tem que ter jogo de cintura para negociar com esses caras.

Cosmo Palasio

Eles acham que segurança se garante com a ausência do equipamento. E não é isso. Seria como proibir os carros coma intenção de acabar com os atropelamentos.

FOCO NA EDUCAÇÃO

Wilson de Mello Júnior

Na opinião dos senhores, de que maneira podemos contribuir com esse processo de discussão?

Haruo Ishikawa

A grande dificuldade em levar esta contribuição é que as entidades representantes dos setores produtivos acabam não participando dessas discussões. Até porque essas discussões não têm um conteúdo que chame a atenção. Até mesmo se isso for colocado na grande mídia, ninguém lê.

Na base de todo o problema dos acidentes de trabalho no Brasil está a Educação. Educação em todos os sentidos. Temos que educar os empresários, os trabalhadores, os sindicatos, o governo, os auditores fiscais, os engenheiros, etc. O Brasil não sai desse marasmo sem Educação. Para se ter uma ideia do tamanhão do problema, em 2004, a Construção Civil tinha, segundo o IBGE, 1,5 milhão de trabalhadores com carteira assinada. Hoje, 10 nos depois, são 3,5 milhões de trabalhadores com carteira assinada. Vocês acham mesmo que esses 2 milhões de novos trabalhadores que entraram na Construção Civil foram qualificados? Ninguém fez nada.

Cerca de 32% desses trabalhadores eram ajudantes, serventes. O restante eram pessoas que trabalhavam em casa, fazia pequenos serviços de pedreiros, faziam bicos, e que acabaram entrando para a Construção Civil, através de empregos formais, porque os salários aumentaram e passaram a ser atrativos. Só que eles não tiveram educação nem qualificação para isso.

Nas notem que os acidentes de trabalho não cresceram na mesma proporção que o número de trabalhadores do setor. Por isso é que eu afirmo que nós melhoramos demais as questões de segurança e saúde no trabalho da construção.

Grandes Construções

Na opinião dos senhores, que impactos as reedições da NRs podem causar sobre a frota de equipamentos para a construção no Brasil. Sabemos que há uma boa parte da frota com uma sobrevida ainda longa, mas que teria que ser sucateada por não atender às exigências das normas de segurança.

Haruo Ishikawa

Tem uma portaria do Ministério do Trabalho que diz que qualquer alteração em uma Norma Regulamentadora tem que partir de análises dos aspectos sociais e econômicos. Vejamos o aspecto social, por exemplo: Outro dia eu fui apresentado a um operador de máquina, trabalhando numa obra, que escava um talude como se estivesse fazendo a barba com uma navalha, tamanha a precisão com que ele trabalha. Há mais de 20 anos ele só faz isso. Pois esse profissional não tem Carteira Nacional de Habilitação (CNH) e é analfabeto. Eu concordo que tem que haver avanços, mas esse pessoal não pode ser excluído do mercado de trabalho. Daqui para frente, todos os que forem operar máquinas têm que fazer os cursos. Mas não pode deixar tanta gente sem trabalho.

Agora vejamos o aspecto econômico da questão: digamos eu tenha uma máquina que custou US$ 2 milhões. Como é que eu posso, depois de dez anos, tirar essa máquina de atividade? Imagine o dono de uma máquina dessas que tem um engenheiro de manutenção cuidando dela, para que sua vida útil seja longa, aí vem meia dúzia de “nós cegos” e, numa canetada, decide que tem que toirar essa máquina do mercado.

REGRAS INVIÁVEIS

Wilson de Mello Júnior

O que me assustou mais, numa reunião de comitê, foi quando eu ouvi dizerem que teria que por cabine nova em máquina velha. Uma proposta dessa, que partiu de um representante de sindicato, vai na verdade é acabar com os empregos. A maior parte das máquinas da frota existente no Brasil está nas mãos de locadores que possuem entre cinco e seis máquinas. Quanto custaria por uma cabine nova nessas máquinas?

Decio Branco de Mello Filho

E sabe quanto custa a certificação de uma cabine? Eu conheci uma empresa que faz cabines, no interior de São Paulo. O projeto é muito bom. Mas quando eu perguntei pela certificação eles me disseram que não tinham, porque isso exige ensaios destrutivos das cabines. “Para se conseguir a certificação eu tenho que destruir uma máquina, o que me custa R$ 200 mil”, me informou o fabricante. Ele tem que fazer o capotamento da máquina para saber se o material da cabine vai resistir. Esse custo não é interessante pra ele.

Wilson de Mello Júnior

Atualmente, no Brasil, somente nos setores de Construção e Mineração, nós temos um parque de mis de 600 mil equipamentos, de acordo com a última pesquisa realizada pela Sobratema. Desse total, cerca de 180 mil são da Linha Amarela. E mais de 50% dessas máquinas tem mais e cinco anos de uso. Muitos deles nem daria, tecnicamente, para se adaptar uma cabine. Então, do jeito que a norma estava sendo proposta, no dia seguinte à sua vigência teria que parar o Brasil.

Uma coisa é determinar isso. Outra coisa é dizer: a partir de hoje, todas as máquinas novas, para entrar em operação no Brasil, têm que ter esses itens de segurança. Foi assim com o cinto de segurança nos carros de passeio, com o freio ABS, o airbag. É preciso que seja dado um período de adaptação para que o problema seja resolvido. Mas não. As pessoas tomam as decisões sem saber sequer o tamanho do mercado que vai ser afetado por elas.

Grandes Construções

Cada vez que se muda uma norma dessas, quanto custa implementar essas mudanças dentro de uma empresa? Dá para quantificar qual é esse impacto?

Wilson de Mello Júnior

Para implementar essas mudanças você precisa mobilizar no mínimo um engenheiro de Segurança, uma equipe de técnicos de Segurança, os técnicos de Gestão. Tudo isso tem custo. O que vemos é que, de um lado, o próprio Governo exige que as empresas se adaptem e invistam nesse processo. Mas ao mesmo tempo, quando se pega as bases de dados de custos unitários de obras, você descobre que estes gastos adicionais não são considerados. E toda norma emitida pelo governo onera as empresas.

E um detalhe: As empresas gastam muito e gastam de maneira errada, porque não estão de fato preservando a segurança do trabalhador, não estão atuando, de forma efetiva, na frente de serviço.

Cosmo Palasio

Vamos pegar como base uma empresa pequena, ume empreiteira com 100 operários. Ela vai gastar por cabeça, ao ano, cerca de R$ 250,00 em exames. Para simplesmente não ter nada em troca. Um eletroencefalograma, por exemplo, não é base para diagnóstico pata trabalho em altura. Quem diz isso é a própria Associação Nacional Saúde e Segurança do Trabalho (Anasst) diz isso.

Outro problema é que, de 100% das empresas brasileiras que têm profissionais de Segurança, mais de 90% têm apenas técnicos de Segurança. Engenheiro já é um exagero. No entanto, a maioria das entidades só fazem eventos para engenheiros. As empresas acabam ficando sem gestores internos para tocar seus processos.

Assim, quando sai uma norma dessas, do Governo, a Petrobrás vai e implanta a norma. Aí, a mercearia da esquina acha que tem que implantar a norma no padrão Petrobras. Por falta de gestor.

CAPACITAÇÃO DOS LEGISLADORES

Wilson de Mello Júnior

O que eu sinto é que todo mundo conhece os problemas, mas poucas pessoas falam deles, escrevem e divulgam isso de uma forma aberta. Eu não sei se é receio, ou o que é. Mas nós temos que trazer esses assuntos à tona e a exigir do próprio governo um posicionamento adequado. Eles fazem o que querem e nós aceitamos isso.

Haruo Ishikawa

No Rio Grande do Sul, os auditores estão embargando obras que estão colocando bandeja, mas isso é previsto na NR-18. Eles alegam que não é seguro na hora da desmontagem e exigem a substituição por tela. Os construtores ligam para nós, para pedir orientação, e nossa Assessoria Jurídica recomenda que entrem com ação liminar preventiva, alegando que está previsto em norma. E o auditor não pode embargar a obra.

Lá no Rio Grande do Sul, a relação do patronato com os empregados é muito boa. Mas a relação com o Ministério do Trabalho não é. Por isso, tem muita construtora aqui de São Paulo, que não quer mais fazer obra no Rio Grande do Sul.

Antigamente para se trabalhar na auditoria de Fiscalização do Ministério do Trabalho tinha que ser Médico do Trabalho ou Engenheiro de Segurança.  Esses podiam fazer concurso público, porque já atuavam na área. Hoje isso mudou. Eu já encontrei nas obras fisioterapeutas, professores de educação física, psicólogos, que passaram no concurso, mas que não sabem o que é uma obra. Eles vão para o canteiro com aquele check list e vai marcando. No final ele aplica 50 multas.

Aí você pega essas multas, vai no Ministério do Trabalho, pega um auditor experiente ele vai relevar. Porque tem vários tipos de multas que dependem da dupla visita. O auditor identificar o problema e depois ele volta para ver se foi solucionado.

Tem muita coisa errada. Eu não gosto de falar mal da fiscalização, porque acho que o papel do empresário é investir na área de segurança. Eu tenho certeza que se isso acontecer estaremos minimizando um monte de problema.

Wilson de Mello Júnior

Em uma das reuniões para discutir NRs, eu ouvi, acho que de um representante do sindicato dos trabalhadores, que deveriam exigir segundo grau de escolaridade para operadores de máquinas. Eu falei que nós teríamos que demitir todo mundo que está trabalhando hoje, então.

Haruo Ishikawa

Eu acho que no futuro será o seguinte: nós deveremos certificar tudo o que for possível, mas que isso seja voluntário. Tirar do mercado aquele trabalhador que se formou a partir da experiência seria desastroso.

Wilson de Mello Júnior

A certificação é importante. Você define os critérios que são necessários, mas não se pode excluir e desprezar as pessoas que estão no mercado, já trabalhando naquela função. No caso do rigger, por exemplo, o perfil que a gente quer é que seja engenheiro, mas tem muita gente que faz projeto de içamento, que está no mercado há muito tempo, que nem curso técnico tem. Esse profissional pode ser reconhecido, através de uma declaração da empresa, que ele executou aquele serviço sem acidente durante aquele período.  Isso a Norma 17124, sobre a certificação de pessoas, obriga que se dê a oportunidade para as pessoas que estão atuando no mercado serem certificadas. O objetivo da certificação é simplesmente garantir a quem está contratando o serviço, que aquela pessoa está apta a executá-lo.

Temos que tomar muito cuidado nesse processo. Caso contrário os danos para  o setor serão irreversíveis.

 

 

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