Embora tenha impacto direto no famigerado Custo-Brasil, o déficit de infraestrutura de transporte rodoviário no Brasil também gera um mercado potencial significativo para investimentos e operação privadas via contratos de parcerias.
Com orçamentos públicos cada vez mais limitados, o necessário crescimento da participação privada demanda a expansão de fontes de financiamento para viabilizar investimentos, como reconhece a própria Confederação Nacional do Transporte (CNT).
Nesse quadro, o mercado de capitais representa uma fonte de recursos adicional para viabilizar o aumento dos investimentos em infraestrutura. E, com o novo modelo de concessões rodoviárias, apresentado recentemente pelo Ministério dos Transportes, a participação de fundos de investimentos tende a crescer no setor.
Em entrevista exclusiva concedida à Revista Grandes Construções, o sócio e assessor de investimentos da Blue3, Luiz
Embora tenha impacto direto no famigerado Custo-Brasil, o déficit de infraestrutura de transporte rodoviário no Brasil também gera um mercado potencial significativo para investimentos e operação privadas via contratos de parcerias.
Com orçamentos públicos cada vez mais limitados, o necessário crescimento da participação privada demanda a expansão de fontes de financiamento para viabilizar investimentos, como reconhece a própria Confederação Nacional do Transporte (CNT).
Nesse quadro, o mercado de capitais representa uma fonte de recursos adicional para viabilizar o aumento dos investimentos em infraestrutura. E, com o novo modelo de concessões rodoviárias, apresentado recentemente pelo Ministério dos Transportes, a participação de fundos de investimentos tende a crescer no setor.
Em entrevista exclusiva concedida à Revista Grandes Construções, o sócio e assessor de investimentos da Blue3, Luiz Scavone, explica que o atual cenário econômico de fato é favorável aos fundos voltados para a infraestrutura, com destaque para rodovias, especialmente pelos prazos mais longos das concessões, o que favorece a redução das taxas de descontos e, indiretamente, as taxas de juros de longo prazo (NTN-Bs).
“A nova política de concessão de rodovias busca tornar os contratos mais seguros e sustentáveis econômica e financeiramente, além de padronizar os projetos, o que são aspectos importantes para atrair investimentos ao setor”, comenta Scavone.
Com 25 anos de experiência no mercado financeiro, o executivo é formado em administração de empresas pela Universidade Mackenzie e pós-graduado em administração com ênfase em finanças pela Escola de Administração de Empresas de São Paulo (EAESP/FGV). Com certificação CFP (Certified Financial Planner) desde 2008, Scavone tem passagens pelo Unibanco, nas áreas de Private Banking e Asset Management, assim como pelo Itaú Private Bank e pelo Banco Safra, também em Private Banking e no Safra Asset.
‘É importante desenvolver e fomentar novos participantes para aumentar a disputa pelas concessões rodoviárias, o que pode ser feito estruturando-se lotes com um volume menor de investimentos”, diz ele. “Em alguns casos, lotes com investimentos muito elevados ou com obras muito complexas podem limitar o número de participantes com capacidades técnicas e financeiras adequadas”, avalia Scavone. Acompanhe.
Fundos de investimento têm apresentado uma forte participação nas licitações de rodovias, o que é evidenciado por processos recentes
• Como avalia a participação atual dos fundos de investimentos no setor de rodovias no Brasil? É possível traçar um comparativo de evolução?
Nas primeiras licitações de rodovias realizadas no Brasil, a participação era concentrada em players não-financeiros (operadores e/ou construtoras). No caso dos operadores, em muitos casos, a estrutura acionária era composta por construtoras. Já há alguns anos, os fundos de investimento têm participado do setor através da participação em licitações ou da aquisição direta de ações no mercado secundário. Nos últimos meses, em especial, os fundos têm apresentado uma forte participação nas licitações, o que é evidenciado por processos recentes como MG Lotes 1, 2 e 3, Rodoanel Norte e PR Lotes 1 e 2.
•A CNT aponta a necessidade de aumento da participação do capital privado no setor. O que pode levar à expansão da participação dos fundos?
A participação do capital privado no setor, de fato, tem se tornado cada vez mais importante. Entre os fatores que podem levar a uma maior participação dos fundos, destacamos uma maior percepção de segurança jurídica, edital e contrato de concessão com matriz de risco e mecanismos claros e bem-definidos de mitigação de riscos (já houve avanços positivos nesse aspecto), assim como retornos de projeto condizentes com as atuais condições do mercado (considerando que alguns editais apresentam premissas e estudos macroeconômicos defasados) e lotes com montante menor de capex.
• Alguns analistas apontam que trechos menos “atrativos” podem ter dificuldades de concessão. O fator de “eixo equivalente” é crucial para a participação dos fundos?
Não enxergamos o fator de “eixo equivalente” como um aspecto crucial para participação dos fundos no setor. Em geral, o fator de “eixo equivalente” para cada modalidade de veículo é definido na documentação da licitação e, independentemente dos valores/fatores adotados, o seu impacto no projeto pode ser dimensionado previamente à participação na licitação. Em nosso entendimento, os fatores apresentados na pergunta acima são mais relevantes para participação dos fundos.
• O atual cenário econômico é favorável aos fundos voltados para rodovias? Por que há tantos fundos participando dos leilões?
Sim. Devido ao perfil de prazos (duration) mais longos das concessões rodoviárias, o investimento torna-se bastante favorecido com a redução das taxas de descontos e, indiretamente, das taxas de juros de longo prazo (NTN-Bs). Dessa forma, como as taxas de juros de longo prazo estão elevadas frente aos últimos anos, há a possibilidade de ganhos com essa redução.
Além de retornos condizentes, fatores como segurança jurídica, matriz de riscoe mecanismos de mitigação podem ampliar a participação dos fundos no setor
• Qual é a estimativa do volume de participação dos fundos em termos de investimento no setor de rodovias?
Em termos de capital privado, em adição aos investimentos já contratados em licitações anteriores, enxergamos uma intenção de mais concessões em nível federal para os próximos anos. Essa tendência de crescimento é muito positiva para o Brasil, uma vez que, à medida que o setor amadurece, novos participantes (nacionais e internacionais) entram no mercado.
• Como isso se reverte para o usuário das rodovias em termos de alocação de recursos e aprimoramento da malha logística?
Além do financiamento público através de banco de fomento, as rodovias também obtêm financiamento através de bancos comerciais e debêntures de infraestrutura. Os ativos de renda fixa, em especial as debêntures de infraestrutura, permitem tanto um maior nível e ritmo de investimentos no setor (através da alavancagem financeira das empresas), quanto um maior nível de desconto nas tarifas de pedágio (dado que, em geral, tendem a aumentar a taxa interna de retorno alavancada do acionista). Nesse sentido, os ativos de renda fixa são importantes para acelerar o ritmo de ampliação da malha logística, evitando e resolvendo gargalos logísticos do país. Adicionalmente, os investimentos em debêntures de infraestrutura revertem-se ao usuário, seja permitindo descontos maiores nas tarifas de pedágio, quanto acelerando o ritmo de investimento e, consequentemente, a qualidade das rodovias.
Para o especialista, ativos de renda fixa são importantes para acelerar o ritmo de ampliação da malha logística, evitando e resolvendo gargalos logísticos do país
• Para o investidor, quais são os riscos e o potencial de retorno dos investimentos em debêntures de infraestrutura?
Assim como outros investimentos em crédito privado, o investimento em debêntures de infraestrutura está exposto, dentre outros, aos riscos de crédito e de liquidez. Com relação ao primeiro item, os fluxos de caixa das rodovias (e, consequentemente, sua capacidade de repagamento das dívidas) podem ser impactados por tráfego menor de veículos que o projetado, sobrecusto e/ou atraso na execução dos investimentos e impasses regulatórios. Com relação ao potencial de retorno, as debêntures de infraestrutura de rodovias, os dados disponibilizados pela ANBIMA (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais) apresentam TIR de IPCA + 6,5% a IPCA + 9%.
• O segmento trabalha com conceitos como “elasticidade”, que é a variação da demanda da rodovia em relação à variação do PIB. O que isso significa em termos de aportes privados no setor?
Em geral, para projetar a demanda de uma rodovia são realizados estudos especializados nos quais são levados em consideração diversos fatores, incluindo variação do PIB, perfil de tráfego, rotas de fuga e outros. De forma geral, quanto maior o histórico de demanda de uma rodovia (especialmente com pedágio) e mais resiliente for a demanda em relação às variações negativas do PIB, mais segurança terá o setor privado em relação à projeção de demanda. Dessa forma, torna-se mais propenso em investir no setor e/ou no ativo. Com relação ao valor em si, assumindo que haja conforto do investidor com a projeção de demanda e a elasticidade observada, uma maior elasticidade tende a significar um maior crescimento do tráfego e, portanto, um maior crescimento da receita e da geração de caixa do projeto. Nesse contexto, uma maior elasticidade também significa maior capacidade de alavancagem e, portanto, maiores aportes no setor.
• De 2010 a 2015, cerca de 5 mil km de rodovias federais foram transferidos para a iniciativa privada. Quais são os principais entraves que impedem um avanço mais rápido?
Alguns players com participação no setor apresentaram dificuldades financeiras nos últimos anos. Nesse sentido, como os projetos licitados envolvem montantes elevados de investimentos e necessidade de capital próprio, o número de players com capacidade financeira e técnica para participar das concessões de rodovias federais ainda é restrito.
• Os critérios dos modelos de contratação vêm melhorando? Como avalia o sistema híbrido, com critérios de menor tarifa e maior outorga?
Na nossa visão, os critérios dos modelos de contratação vêm melhorando, incluindo nos editais regras e mecanismos mais claros e adequados para a participação de fundos de investimentos. Avaliamos o sistema híbrido como positivo, já que evita que lances muito agressivos possam levar o ativo à insustentabilidade financeira, como já ocorreu em licitações anteriores. Adicionalmente, o modelo que envolve aportes adicionais de capital na concessionária, em caso de descontos na tarifa superiores a determinado nível, também pode evitar essa situação.
• O reequilíbrio econômico-financeiro é uma das principais demandas das concessionárias. Por que isso é tão importante neste momento pós-pandemia?
Com a pandemia, as concessões rodoviárias foram impactadas não só pela redução de demanda, mas também pelo aumento dos custos de insumos para o setor. Nesse contexto, as discussões de reequilíbrio econômico-financeiro são importantes para garantir a sustentabilidade econômico-financeira dos contratos e, dessa forma, garantir a manutenção do nível de investimentos e de qualidade nas rodovias. Adicionalmente, a resolução dessas demandas de forma adequada é importante para demonstrar a segurança jurídica do setor rodoviário e, dessa forma, estimular a participação da esfera privada neste modal.
Projetos licitados envolvem montantes elevados de investimentos e necessidade de capital próprio, acentua Scavon
• Com o advento da chamada Lei de Relicitação (no 13.448), pode-se dizer que impasses de fluxo de caixa e de investimentos são coisas do passado? Como essa lei afetou o setor?
Apesar de a Lei de Relicitação aumentar o rol de alternativas para equacionar impasses de fluxo de caixa e de investimentos, ainda há ativos com discussões em pleno andamento no setor. Deve-se levar em consideração, por exemplo, que o processo de relicitação possui um rito extenso, que envolve a realização de estudos e interações/aprovações com a sociedade e as autoridades governamentais. Além disso, eventuais condições adversas de mercado podem dificultar a relicitação de projetos. Nesse quadro, fatos recentes têm sinalizado que o setor tem retomado discussões de reequilíbrio econômico-financeiro em detrimento à relicitação de projetos com impasses.
• Como avalia as políticas e condições do novo PAC voltadas para o setor de rodovias, assim como novos marcos regulatórios, concessões e privatizações?
A regulação do setor de rodovias como um todo tem evoluído nos últimos anos. Também temos visto inovações positivas nos editais e contratos de concessões, incluindo mecanismos que mitigam os riscos, tanto para acionistas, quanto para financiadores de projetos de rodovia. Naturalmente, ainda há avanços que podem ser realizados com o intuito de permitir uma maior participação do setor privado no setor. Tendo em vista o tamanho do pipeline de novos projetos de concessões e privatizações, além do montante de investimentos envolvidos, é importante a interação constante entre o poder público e o setor privado, de forma a identificar eventuais pontos de melhoria.
Para o assessor, a nova política de concessão busca tornar os contratos mais e sustentáveis econômica e financeiramente, além de padronizar os projetos
• Com a nova política de concessão haverá uma maior disputa pelas rodovias?
A nova política de concessão de rodovias busca tornar os contratos mais seguros e sustentáveis econômica e financeiramente, além de padronizar os projetos de concessão, o que são aspectos importantes para atrair investimentos ao setor. Por outro lado, é importante desenvolver e fomentar novos participantes para aumentar a disputa pelas concessões, o que pode ser feito estruturando-se lotes com um volume menor de investimentos. Em alguns casos, lotes com investimentos muito elevados ou com obras muito complexas podem limitar o número de participantes com capacidades técnicas e financeiras adequadas.♦ (MJ)
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