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Revista GC - Ed.60 - Junho 2015
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Matéria de Capa - Fábrica da Jeep

Da plantação da cana à indústria automobilística, um salto para o futuro

Nova fábrica da Jeep abre portal de desenvolvimento para Zona da Mata Pernambucana
Por Mariuza Rodrigues

São tantas as atrações que nos levam a Pernambuco. As suas belas praias, o carnaval quente, a rica cultura de sons, sabores e de cores, o povo... E agora a moderna fábrica da Jeep, em Goiana, na Zona da Mata pernambucana, um pedaço de futuro em pleno sertão nordestino.  Goiana fica a 70 km de Recife, ou a uma hora de distância, de automóvel.

Sim, vale a pena ir até lá para conhecer a fábrica, um filhote da união Fiat Chrysler, que parece ter sido concebida, entre outros objetivos, como uma espécie de fábrica-shopping, uma unidade de produção transparente, visível  por grandes painéis de vidro, com 27º de temperatura na área interna, e um layout administrativo que pode dar a impressão de se estar em uma empresa moderna da família da Informação, como Facebook ou Google. A esta altura, já é velho dizer que a fábrica Jeep de Goiana é a mais moderna do grupo, com a capacidade de injetar, no mercado da América Latina, 250 mil veículos por ano e conclui um investimento direto total de aproximadamente R$ 7 bilhões.

Pernambuco, assim como a Região Nordeste, vem destacando-se há uma década


São tantas as atrações que nos levam a Pernambuco. As suas belas praias, o carnaval quente, a rica cultura de sons, sabores e de cores, o povo... E agora a moderna fábrica da Jeep, em Goiana, na Zona da Mata pernambucana, um pedaço de futuro em pleno sertão nordestino.  Goiana fica a 70 km de Recife, ou a uma hora de distância, de automóvel.

Sim, vale a pena ir até lá para conhecer a fábrica, um filhote da união Fiat Chrysler, que parece ter sido concebida, entre outros objetivos, como uma espécie de fábrica-shopping, uma unidade de produção transparente, visível  por grandes painéis de vidro, com 27º de temperatura na área interna, e um layout administrativo que pode dar a impressão de se estar em uma empresa moderna da família da Informação, como Facebook ou Google. A esta altura, já é velho dizer que a fábrica Jeep de Goiana é a mais moderna do grupo, com a capacidade de injetar, no mercado da América Latina, 250 mil veículos por ano e conclui um investimento direto total de aproximadamente R$ 7 bilhões.

Pernambuco, assim como a Região Nordeste, vem destacando-se há uma década no cenário nacional, com um substancioso crescimento alavancado pelo boom de investimentos públicos, que por sua vez atraiu investimentos privados.  O estado colhe os frutos da consolidação do Porto de Suape como rota portuária para o exterior, além da construção da Refinaria Abreu e Lima, que alavancou a área de engenharia e construção na região. Tudo isso pode estar enevoado pelo escândalo da Lava Jato/Petrolão, que acabou por paralisar parcialmente as obras da refinaria. Mas é preciso olhar para um horizonte mais distante e verificar o impacto que já ocorreu e ainda ocorrerá na economia desse estado, que compete diretamente com Ceará e Bahia pela liderança econômica no Nordeste.

A economista Tânia Bacelar, da Consultoria Econômica e Planejamento (Ceplan), afirma que a chegada do polo automotivo e os investimentos subsequentes terão um impacto enorme no crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) não só de Goiana, como de Pernambuco como um todo.

O Sistema Fecomércio divulgou um estudo inédito sobre as perspectivas para Goiana e outros 13 municípios situados em um raio de 60 quilômetros da fábrica: estima-se que a região receberá um bloco de investimentos de R$ 17 bilhões e se tornará uma das principais impulsionadoras da economia pernambucana.

O estudo leva em conta a previsão inicial de demanda de mão de obra da unidade, de cerca de oito mil trabalhadores, que se somam ao polo farmacoquímico e ao polo de bebidas, com cerca de 4 mil empregos diretos. A conclusão do estudo, entretanto, é de que a principal dificuldade para que os municípios e suas empresas  se beneficiem  desse boom industrial está por conta da baixa oferta de mão de obra qualificada, ou a falta dela, da informalidade dos estabelecimentos e da dificuldades desses locais em se credenciarem como fornecedores das grandes empresas.

Sem falar no atraso dos investimentos previstos para a melhoria da infraestrutura  rodoviária (Arco Rodoviário do Recife) e ferroviária local (Transnordestina), fonte complementar de atratividade do polo industrial da zona da mata pernambucana.

Todos são unânimes em dizer, no entanto, que a base de todas as deficiências é mesmo a baixa qualidade do ensino básico e profissionalizante da região. Esse é o maior desafio a ser superado para os governos, para a iniciativa privada e para as famílias da região.

Fábrica dos sonhos

A região onde hoje mais de 500 braços de robôs se movem, foi dominada, por quase cinco séculos, por imensos canaviais, desafiando uma lógica de que o sertão nordestino era o lugar mais improvável para a construção de uma fábrica automobilística. A implantação da fábrica da Jeep ocorreu em apenas dois anos.

O responsável por esse desafio chama-se Stefan Ketter, que reuniu um time global de especialistas com conhecimento acumulado do grupo Fiat Chrysler Automobiles (FCA). Quando ele chegou a Pernambuco, em julho de 2013, muitos de seus amigos do setor automobilístico diziam que tal projeto era uma loucura.  Relacionavam as dificuldades de logística, além da falta de mão-de-obra, que não permitiriam a conclusão nos prazos previstos.

Paulista, formado na Alemanha, Ketter consolidou a carreira nos Estados Unidos e na Itália. Tornou-se vice-presidente mundial de manufatura e membro do Group Executive Council (GEC), máxima instância executiva global do Grupo Fiat Chrysler. Nessa posição de comando, liderou, em 2011, o processo de modernização da planta de Polimigliano d´Arco, em Nápoles.

A fábrica italiana renasceu, dando um salto em termos de performance alcançada pelos profissionais, dos níveis de segurança implementados, da redução de perdas nos processos, da gestão ambiental aplicada, com o consequente impulso na qualidade dos produtos, a ponto de ser considerada uma das melhores da Europa.

E assim, a unidade, de decadente, passou a servir de base para os projetos futuros do grupo, como as fábricas de Mirafiori, em Turim, na Itália, e a planta da Sérvia. Ketter também comandou a reorganização das fábricas da Chrysler nos Estados Unidos, após a aquisição da empresa pela Fiat. Foi ainda o responsável por coordenar a construção da unidade da Fiat Chrysler em Changsha, na China, uma joint-venture com a Guangzhou Automotive Corp. (GAC).

A fábrica de Goiana, pode-se dizer, era um desafio à altura da capacidade do executivo, que tinha como missão erguer no Brasil um empreendimento que representasse o estado-da-arte em termos de fábrica de veículos. Para isso, ele agregou um time global com múltiplas experiências, que constituiu um microcosmo da futura FCA, criada em 2014 como resultado da fusão.

Mas, segundo Ketter, o principal fator de desvantagem de Pernambuco, a inexistência de uma indústria automobilística, tornou-se seu principal fator competitivo e vantajoso.  Como não tinha vínculo com o setor automotivo, e praticamente não contava com empresas do setor, foi possível pensar a fábrica de uma forma mais “pura”, permitindo conceber uma planta totalmente integrada, o que permitiria ganhos logísticos e operacionais.

O Polo Automotivo Jeep reúne características básicas de uma fábrica flexível e expansível, preparada para crescer no futuro. Ela foi pensada para propiciar  rapidez de planejamento e eficiência na solução de problemas, graças a seu layout enxuto e racional. A fábrica tem fluxos logísticos eficientes dentro da planta e também na integração com o parque de fornecedores, pois o projeto contou diretamente com a coparticipação dessas empresas.

Um dos principais diferenciais está no sistema WCM – Word Class Manufacturing, fundamentado em layouts, fluxos, métodos, que asseguram à planta um elevado nível de qualidade e eficiência. Trata-se de um conjunto de boas práticas, consolidado ao longo de anos e melhorias em diversas fábricas, mas que depende fundamentalmente do envolvimento das pessoas e das lideranças de equipe.

O team leader, que coordena a célula básica de produção com seis trabalhadores, é o elemento-chave da liderança.  “Todos foram capacitados no WCM, com teoria conjugada com prática. Mas parte dos conceitos avançados da WCM ainda não está internalizada em cada pessoa, porque isso requer tempo e injeção de conhecimento.”, diz Ketter.

Dentre as inovações inseridas, destaca-se a implantação do conceito de Communication Center, localizado estrategicamente na base do “U” que forma o desenho da planta. De lá é possível acessar facilmente a pé todos os três prédios da fábrica, estamparia e funilaria de um lado, pintura do outro e montagem final na parte de trás. Em formato de escritório aberto até agora inédito no grupo, seguindo a tendência das empresas de tecnologia como Google ou Apple, no espaço de 11 mil metros quadrados ninguém tem mesa, sala ou telefone fixos. Todos têm seu celular e um laptop e podem ocupar temporariamente qualquer uma das mesas e cadeiras disponíveis. Existem salas envidraçadas para as reuniões mais longas, mas a maior parte dos assuntos é resolvida em pé, em torno de pequenas mesas altas e sem cadeiras, para abreviar as conversas. Quase não há sinais de hierarquia. A maioria das pessoas veste a mesma camiseta polo informal com a marca Jeep no peito, usada indistintamente em todas as áreas da planta, inclusive nas linhas de produção. O centro de comunicação permite, sobretudo, chegar-se a qualquer canto da planta e colher in loco os resultados correntes, o que permite a adoção de providências buscando a melhoria contínua. Faz uma fábrica grande parecer pequena. Dele, é possível olhar para cima e ver se a fábrica está em movimento ou não, ao observar a esteira que transporta as carrocerias da funilaria para a pintura. Tudo ao alcance da vista e de todos.

O norte-americano Joe Ozdowy, chefe de prédios e facilidades, que trabalha há 31 anos na Chrysler (agora FCA), foi escalado em 2012 para coordenar toda a construção do polo com 530 mil metros quadrados de área construída, 260 mil m2 da fábrica e 270 mil m2 dos fornecedores, incluindo prédios e toda a infraestrutura industrial, como fornecimento e tratamento de água, energia, ar comprimido, esgoto etc. Quase um ano depois, em novembro de 2013, chegou ao canteiro de obras de Goiana o italiano Denny Monti, com 20 anos no Grupo Fiat, para montar todo o maquinário e equipamentos da fábrica.

“Foi o maior projeto de construção civil não governamental do mundo. Megaempreendimentos assim surgem talvez uma vez por década”, disse Ozdowy, que se autodenominou Lucky Joe (Joe Sortudo) por ter participado da maior empreitada de sua vida, que chegou a reunir 10 mil pessoas trabalhando no pico das obras. Para construir a fábrica pernambucana a FCA contratou o consórcio formado pela brasileira Construcap e a americana Walbridge, que nos últimos 50 anos foi responsável por erguer mais da metade das plantas do setor automotivo nos Estados Unidos. Uma das premissas foi privilegiar a contratação de empresas de serviços e fornecedores locais, desde que fosse possível assegurar a qualidade dos serviços contratados. Foram priorizados os sistemas industrializados, como pré-moldados, fornecidos por uma empresa regional.

Segundo Monti, foram aplicados conceitos de flexibilidade, modularidade e automação únicos no mundo, que permitem montar até quatro modelos de carros diferentes ao mesmo tempo e na mesma linha. Futuras expansões também estão previstas no projeto. A planta poderá dobrar sua capacidade para 500 mil unidades/ano, pois há espaço de sobra para ampliar os prédios. São 700 robôs de última geração, e dois mil trabalhadores, muitos deles ex-lavradores, que poderão somar 3,8 mil quando a planta atingir a plena capacidade de 250 mil veículos/ano, ao ritmo de 45 unidades/hora.

Embora tenha sido oficialmente batizada como fábrica Jeep – a primeira da marca fora dos Estados Unidos –, está certo que em Goiana poderão ser produzidos carros de qualquer uma das marcas do grupo FCA, incluindo principalmente a Fiat. “Adotamos a estratégia de dar um nome às fábricas da empresa, porque achamos importante que nossos empregados se identifiquem com uma marca e isso também ajuda na propaganda. Mas fizemos aqui uma planta totalmente flexível, que pode fazer diversos modelos de veículos e também pode ser facilmente expandida”, explica Stefan Ketter.

Estado da arte

O processo produtivo em Goiana inicia-se na área de estamparia, instalada em uma das pontas do “U” que forma o desenho da fábrica de 260 mil metros quadrados. Ali as bobinas de aço alimentam uma linha automatizada da Schuler de limpeza e corte das chapas, que então são encaminhadas para duas linhas de prensas automáticas de transferência da Komatsu – foram necessários dois navios para trazer do Japão o maquinário de cinco mil toneladas acondicionado em mil volumes, que levaram dois meses para atravessar o oceano e outros 15 dias em caminhões entre o Porto de Suape e Goiana.

O ritmo de produção é frenético: uma das prensas trabalha a 18 batidas de 2,5 mil toneladas por minuto, a outra bate 16 por minuto a duas mil toneladas. As trocas de matrizes, perto de 60 ao todo, são feitas em apenas quatro minutos por meio de trilhos. São moldadas 40 peças de cada carro, o que corresponde a 90% da carroceria. O setor é capaz de estampar algo como 48 mil partes para 1,2 mil veículos por turno de oito horas. Existem, ainda, duas outras prensas menores para testes de estampagem com novos ferramentais.

Logo na sequência do mesmo prédio está a área de funilaria, que recebe as partes da estamparia e de alguns outros fornecedores para soldar toda a carroceria, em uma das linhas de produção mais automatizadas e produtivas do mundo. São poucas as estações de trabalho em que há contato humano com as peças, por isso o setor pode trabalhar com o máximo de 500 pessoas. A Comau – braço de instalações industriais da FCA – instalou os robôs que aplicam três mil pontos de solda no corpo de aço dos veículos. Também foi instalada uma linha paralela, exclusiva para treinamento do pessoal.

Em um processo inovador, os robôs estão fixados no chão e no teto, para aumentar o número de operações em uma única estação e reduzir as etapas de soldagem, evitando assim desvios na geometria da carroceria que acontecem durante o transporte entre um processo e outro. Logo no início da linha todo o “esqueleto” principal do carro (assoalho e laterais) é unido e armado por 18 robôs que executam perto de 150 pontos de solda em apenas um minuto e meio.

A funilaria tem um sistema de produção extremamente flexível; pode armar 45 carros por hora de até quatro modelos diferentes sem necessidade de troca de ferramentas. O setor está conectado ao sistema central de informática, de onde recebe as ordens para montar cada carroceria de acordo com a configuração do veículo vendido. A pintura da fábrica de Goiana é totalmente automatizada: 48 robôs aplicam o primer já misturado à cor do veículo. Na linha de montagem final, a ergonomia foi pensada para obter o máximo de produtividade.

Da funilaria, as carrocerias seguem por meio de um transportador aéreo para a outra perna do “U”, onde fica a linha de pintura, também altamente automatizada, em que a mão de obra humana é mais utilizada para supervisionar máquinas do que executar tarefas manuais. O setor entrega até 45 carros/hora, em um processo que pode abrigar até 150 veículos ao mesmo tempo e inclui dois banhos de imersão (limpeza e cataforese anticorrosão), selagem de frestas, além de pintura e aplicação de verniz totalmente automatizadas, executadas por 48 robôs, passando por quatro fornos de secagem ao longo da linha.

Com o processo “primeless” foi eliminada a aplicação de primer e um dos fornos normalmente utilizados na maioria das áreas de pintura das montadoras. A tinta-base e a cor final são aplicadas de uma só vez, reduzindo assim a quantidade de água e energia utilizadas. As tintas são à base d’água, o que evita emissões de solventes na atmosfera.

Ao ritmo de música

Na base do “U” fica a linha de montagem final, com 150 estações distribuídas em quase três quilômetros, para instalar cerca de dois mil componentes nos carros. Cada uma leva cerca de um minuto para montar as peças em um carro. Toda a ergonomia foi pensada para dar ao setor a mais alta produtividade do mundo. “Cada operador gasta em média 70% de seu tempo de trabalho agregando valor ao produto e o resto com ajustes e buscando componentes ou ferramentas. Esse é o maior índice já conseguido por uma fábrica e é quase impossível avançar além disso. Nas montadoras japonesas, que são referência de eficiência, esse porcentual varia de 60% a 65%”, afirma um orgulhoso Ketter.

Ao contrário da maioria das montadoras, que tem uma única entrada para receber componentes dos fornecedores, a nova fábrica da FCA tem dezenas de docas localizadas bem ao lado da linha de montagem. A todo o momento chegam peças exatamente no tempo e na sequência em que elas serão usadas (just in time e just in sequence), sem formação de estoques.

O Renegade, o primeiro produto da Jeep Goiana, já nasce com 70% de conteúdo local, que deve subir a 80% nos próximos meses, sendo que 40% de suas partes já são fornecidas por 16 empresas instaladas no parque de fornecedores situado dentro do terreno da planta, responsáveis por entregar 17 linhas de produtos já montados, como bancos, painéis, conjuntos soldados, grandes peças plásticas e rodas já calçadas com pneus. A FCA montou um complexo sistema logístico para receber as demais peças que vêm de fornecedores do Sul e Sudeste. Eles entregam os pedidos em dois centros, um em Minas Gerais e outro em São Paulo, e de lá a própria montadora assume o transporte em linhas de caminhões criadas especialmente para abastecer Goiana.

Segundo Ketter, o controle de qualidade é uma constante, com cerca de 10 mil inspeções na linha feitas pelos próprios operadores. “A ideia é não deixar nenhum problema passar adiante”, ele destaca. Todas as ocorrências durante a montagem são registradas em um monitor com tela sensível ao toque instalado em cada estação, que alimenta o sistema central e avisa as áreas responsáveis sobre possíveis problemas a resolver. Ao fim do processo, todos os carros já montados passam por uma auditoria final e um teste de pista.

Existem ainda três centros de controle para peças, veículos e processos, responsáveis por examinar meticulosamente os componentes e carros prontos por amostragem aleatória, além de zelar pela eficiência da produção como um todo. “Usamos aqui métodos de escaneamento para verificar a conformidade de peças e veículos que ainda não são usados pela maioria das montadoras. Filmamos o componente e o computador já o compara com a peça ideal gravada no sistema, para mostrar na tela do computador tudo que estiver errado ou fora de medida”, exemplifica Ketter.

Ao caminhar pela linha de montagem, o visitante pode ouvir cerca de 60 músicas diferentes a cada turno, do rock metal ao frevo. Elas são tocadas sempre que um operador precisa chamar o líder de equipe para resolver qualquer problema da estação.

Existe uma música para cada um dos 60 líderes, em média um para cada grupo de seis pessoas. Sempre que ouvem sua música ou recebem um aviso no palmtop que carregam consigo, eles correm para a estação onde estão seus liderados, para verificar o que está acontecendo. O líder é considerado o personagem mais importante da produção em Goiana. É ele quem cuida de aplicar todos os conceitos do World Class Manufacturing, assegura a qualidade, faz a ponte entre empregados e diretoria, negocia as folgas de seu grupo, intermedia problemas, e atua como as notas musicais de uma sinfonia.

O projeto de Goiana  reúne não somente a fábrica da FCA, mas também 16 fornecedores. Eles ocupam, em sistema de condomínio, vários prédios construídos pela FCA, os quais ficam ao lado da unidade principal, separados dela somente por uma cerca e uma guarita de controle, para fornecer peças just-in-time.

Produção sustentável

O polo da Jeep foi idealizado e construído seguindo os conceitos mais atuais de uma fábrica com baixo impacto ambiental. A unidade tem capacidade de reuso de 98% da água com sistema próprio. São 128 mil litros por hora para tratamento com utilização das tecnologias de Membranas (MBR) e Osmose Reversa. A água utilizada nos vasos sanitários, irrigação de áreas verdes, tanques de pintura, entre outros processos, é água de reuso.

No âmbito energético, a planta também conta com mecanismos inovadores. O menor consumo de energia acontece na utilização de compressores inteligentes nos sistemas de refrigeração, que funcionam por módulos e são ativados quando necessário, evitando o uso contínuo. Nos telhados das unidades de prensas e do Communication Center, placas de lentes prismáticas garantem a iluminação natural  dos galpões, sem que haja transferência de calor.

A automação do controle do sistema de ar comprimido em toda a planta Jeep também está contribuindo  para o menor consumo de energia. A tecnologia gerencia o uso simultâneo e eficiente de vários compressores por meio do compartilhamento da carga e da redução de ar, evitando o consumo de energia para alimentar a demanda. Sem a automação, o desperdício pode chegar a 60%.Práticas avançadas do sistema de gestão ambiental também foram adotadas. O projeto de biodiversidade Nosso Verde é baseado em estudo inédito para resgate histórico da flora da Zona da Mata Norte. Ao todo, foram inventariadas mais de 600 espécies nativas e, já no início do projeto de paisagismo, foram selecionadas cerca de 250 espécies diferentes, que estão sendo plantadas no entorno da fábrica.

Capital Humano

Paralelamente à construção do Polo Automotivo Jeep, era necessário formar uma cultura organizacional capaz de suprir a mão de obra local.  "Encaramos esse desafio como uma oportunidade. Nosso objetivo primário era compreender a realidade local e os desafios que projetos dessa magnitude poderiam apresentar. Para isso, vários colegas de RH da América Latina se envolveram e se juntaram aos admitidos em Pernambuco e aos principais gestores locais. Juntos, agrupamos várias competências”, explica Adauto Duarte, diretor de Recursos Humanos para o Polo Automotivo Jeep.

Ainda em 2010, bem antes do início das obras, a equipe de Recursos Humanos buscou conhecer os costumes locais e estabelecer uma relação próxima com a comunidade. Para isso, foram realizadas várias pesquisas para farta coleta de dados sobre a região. Durante vários meses, a região de Goiana foi toda mapeada e um perfil do Estado foi elaborado. Adauto e seus colegas de RH foram também conhecer grandes obras do Brasil, como o do Porto de Suape, as usinas hidrelétricas do Madeira (Jirau) e obras da Copa, para saber quais os principais obstáculos ocorridos durante a implantação de cada uma. A partir daí, desenharam-se políticas de gestão de pessoas para o projeto, reunindo algumas ações já consolidadas no grupo e criando-se outras. “O desafio era trabalhar políticas para construir um ambiente harmônico no polo, coordenando a atuação de 320 empresas fornecedoras de serviços, e mais de 11 mil pessoas no pico da obra, em 17 prédios agrupados num mesmo local", explica.

Os resultados colhidos concretizam a expectativa inicial de que a implantação do agora Polo Automotivo Jeep representaria um legado para a FCA, para o Estado e para a sociedade. O objetivo maior foi conquistado: desenvolver um novo time de profissionais, capazes de integrar, desenvolver e aplicar conhecimentos mais avançados da indústria automotiva para um mercado em evolução. E na implantação da marca: Jeep.

Para atrair e recrutar talentos, do nível básico ao altamente especializado, a área de Recursos Humanos lançou mão de vários métodos. Utilizou desde websites para receber currículos até carros de som nas ruas dos bairros humildes de Goiana e da região para dar acesso das pessoas ao processo seletivo. Outra decisão importante foi a opção por aproveitar trabalhadores locais em vez de trazê-los de outro lugar. Também se optou por não erguer grandes alojamentos no canteiro da obra, porque a experiência em outras grandes obras mostrou que a alta concentração de gente em alojamento aumenta os índices de violência, prostituição, tráfico e consumo de drogas. No período de construção, 70% de mão de obra na construção eram locais. Os 30% restantes vieram de fora e foram alocados, de forma planejada, em uma série de moradias integradas à cidade, chamadas de 'repúblicas', além de apartamentos, pequenos hotéis alugados ou casas reformadas, com a característica comum de abrigarem um número reduzido de trabalhadores. Para garantir o equilíbrio social nas repúblicas, visitas noturnas com palestras foram realizadas com frequência, em uma articulação da FCA com a Polícia Militar, Secretaria de Ação Social e Conselho Tutelar. Durante a ação, eram discutidos temas de interesse da sociedade como a Lei Seca e o combate à prostituição infantil. Em paralelo, grupos folclóricos apresentavam a cultura local para os recém-chegados a Pernambuco.

O projeto de qualificação de pessoas para o Polo Automotivo Jeep passou por três momentos. Numa primeira etapa, foram treinadas pessoas para a construção civil e instalação de máquinas e equipamentos. O governo do Estado e as prefeituras, em parceria com a FCA, ofereceram ferramentas de qualificação de trabalhadores para as construtoras para permitir que as pessoas da Zona da Mata Norte pudessem trabalhar na construção do Polo. Nesse estágio, o desafio foi vencer, muitas vezes, o baixo índice de escolaridade dessa mão de obra. Muitos precisaram passar por qualificação básica em matemática e português para depois entrarem na capacitação profissional propriamente dita. Muitos vieram do comércio local, como balconistas, ou trabalhavam com cana-de-açúcar. "Apenas nesse estágio de construção civil e implantação de máquinas e equipamentos, capacitamos oito  mil pessoas", revela Adauto. Tal esforço permitiu que esse contingente migrasse de atividade econômica.

Na fase seguinte, de contratação de funcionários para a indústria, também em articulação com o governo do Estado e com o Senai, foram preparados e oferecidos vários cursos técnicos (de mecânica, elétrica, eletrônica etc.) na Zona da Mata Norte de Pernambuco. Parte das pessoas empregadas no polo saiu desse processo. Paralelamente, a equipe de RH passou a articular a formação de pessoas com graduação. Como exemplo, a FCA estabeleceu uma parceria com o governo do Estado, juntamente com a Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia do Estado de Pernambuco (FACEP), para possibilitar a dupla graduação de estudantes de segundo ano do curso de engenharia das universidades locais, em intercâmbio com o Instituto Politécnico de Turim, na Itália. Foram selecionados 20 estudantes brasileiros que foram enviados à Itália e voltaram com dupla titulação e já foram contratados pela FCA.

A criação de talentos para o polo é um processo sem fim. Por isso, foi constituído o Polo de Educação Automotivo, firmado em dezembro de 2014 com a assinatura de um protocolo de intenções entre a Jeep e Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), Universidade de Pernambuco (UPE), Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), Instituto Federal de Pernambuco (IFPE), Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI-PE) e Instituto Euvaldo Lodi (IEL-PE).

Novas práticas

No âmbito da educação, o Polo Automotivo Jeep, criou uma série de ações para estimular e desenvolver o aprendizado de crianças, jovens e adultos. Para isto, estabeleceu compromisso com a Prefeitura de Igarassu, o Instituto de Co-Responsabilidade pela Educação (ICE) e Instituto Qualidade no Ensino (IQE), a fim de melhorar o ensino público do município. O termo de cooperação prevê a qualificação dos docentes, reforço escolar em Matemática, Português e Ciências, e implantação de escolas em tempo integral.

Também estabeleceu parcerias com as principais universidades e centros de ensino de Pernambuco e da Paraíba, para a criação do Polo de Educação Automotiva, inspirado na experiência de sucesso do Vale do Silício, nos Estados Unidos. Outras duas iniciativas foram a distribuição de kits escolares para os filhos dos funcionários e o Compromisso Criança na Escola, através do qual todos os colaboradores com filhos em idade escolar devem comprovar sua matrícula em instituições de ensino.

Uma das ações é melhorar a saúde da população do entorno, através da construção de uma Unidade de Pronto Atendimento Especializado (UPAE), em Goiana, para ampliar a oferta de atendimento médico em diversas especialidades e pequenas cirurgias. Preventivamente, os trabalhadores do Polo Automotivo de Pernambuco participam de programas de conscientização nas áreas de alimentação e saúde com foco na prevenção de doenças crônicas como diabetes e hipertensão. Os restaurantes do polo oferecem alimentação diversificada e balanceada, como parte do programa.

Arco Metropolitano é fundamental para escoamento da produção

O órgão ambiental de Pernambuco liberou somente em abril a licença prévia para o lote 2 do Arco Metropolitano de Recife. O procedimento era necessário para que o DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) elaborasse o termo de referência para lançar o edital da licitação para contratar a empresa responsável pela elaboração do projeto e execução das obras.

O objetivo é construir uma pista dupla que ligará a BR-101 ao norte de Recife com o trecho sul da mesma rodovia, facilitando a mobilidade de cargas que têm como origem ou destino o Porto de Suape. A nova via também vai aliviar o tráfego no trecho da rodovia que passa por Recife, já que vai retirar da capital o trânsito de longa distância.

O empreendimento será custeado com recursos do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) e foi dividido em dois lotes. O lote 2, cuja licença provisória foi liberada, possui cerca de 45 quilômetros, com início no entroncamento com a BR-408, em São Lourenço da Mata, e término no entroncamento com a BR-101, próximo a Cabo de Santo Agostinho. Os procedimentos para a licitação do lote 1, que parte de Goiana, terminando no entroncamento com a BR-408, serão iniciados depois de concluído o processo do lote 2.

O Arco é urgente para desviar da congestionada BR-101 o tráfego pesado que hoje sufoca a rodovia, um trânsito que só piora na medida em que novas indústrias, como o futuro polo automotivo de Goiana, entram em operação. Os primeiros estudos do Arco são de 2008. Diante do custo da obra, na época R$ 1,7 bilhão, o Estado cogitou uma concessão rodoviária, projeto elaborado pela iniciativa privada e com licenciamento iniciado há um ano e meio, mas cancelado. Em abril de 2013, o DNIT assumiu o Arco, porém problemas nos direitos autorais do projeto de concessão restringiram os dados à versão antiga, de 2008, o que motivou uma volta a um estágio inicial dos estudos.

 

 

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